O rapto internacional de crianças na jurisprudência portuguesa em tempos de pandemia

AutorAnabela Susana de Sousa Gonçalves
Cargo del AutorProfessora Associada Escola de Direito da Universidade do Minho
Páginas8-18
— 8 —
O RAPTO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS
NA JURISPRUDÊNCIA PORTUGUESA
EM TEMPOS DE PANDEMIA*
ANABELA SUSANA DE SOUSA GONÇALVES
Professora Associada
Escola de Direito da Universidade do Minho
1. A DECISÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
A pandemia de Covid-19 trouxe diversos desafios para a sociedade e,
consequentemente, para o Direito, em várias das suas vertentes. Especificamente, nas
situações de rapto internacional de crianças, a pandemia revelou-se mais cruel porque
prolongou situações de afastamento de crianças em relação a um dos pais, o que tornou uma
situação que, em circunstâncias normais, já é traumática para a criança, ainda mais difícil e
com consequências mais nefastas para o desenvolvimento psicológico e afetivo da mesma.
Tendo em consideração esta circunstância comum a todos os países, trazemos a
comentário uma decisão do Tribunal da Relação do Porto, de 29 de setembro de 20201,
que foi tomada em plena crise pandémica, em que o Tribunal teve que ponderar os
constrangimentos provenientes da pandemia, mas também tomar uma decisão em nome
do superior interesse da criança. O caso diz respeito a uma situação de deslocação ilícita
de crianças da Venezuela para Portugal pela mãe, sem autorização do pai.
A matéria de facto do caso envolvia uma situação em que uma mãe deslocou os
filhos da Venezuela para Portugal sem autorização do pai. O pai pede o regresso das
crianças à Venezuela, pretensão que tem a oposição da mãe, tendo a resolução desta
situação chegado ao Tribunal da Relação do Porto. Vários argumentos foram utilizados
pela mãe para se opor ao regresso das crianças.
Um deles, que não foi provado, consistia na alegação de que o pai tinha um distúrbio
de personalidade, que não tomava a medicação necessária e consumia álcool excessivo,
sendo uma ameaça para a integridade física e psicológica das crianças.
O segundo argumento consistia na situação de pandemia de Covid-19, que teve
início em 2020 e, ao tempo do julgamento, o grau de contágios era muito elevado e a
* Este trabajo se enmarca en la ejecución del Proyecto de investigación “El Derecho de familia que viene. Retos
y respuestas” [ref. PID2019-109019RB-100], financiado por el Ministerio de Ciencia e Innovación, dentro del Plan
Estatal de Investigación Científica y Técnica y de Innovación 2017-2020. Convocatoria de 2019. Se advierte al lector
que fue finalizado en marzo de 2022.
1 TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, de 24-09-2020, Processo 4033/19.5T8AVR-A.P1, Relator
Aristides Rodrigues de Almeida, http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf
/04d3e36347b03afe80258610004e6c80?OpenDocument&Highlight=0,rapto,internacional,de,crian%C3%A7as, data
de consulta: 20 de dezembro de 2021.

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