Breves comentários ao direito urbanístico no brasil e seus reflexos nas aquisições imobiliárias

AutorFábio Baldissera/Gustavo Hoerbe
CargoAbogados destacados en la Oficina de São Paulo.
Páginas104-111

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Introdução

A preocupação com os aspectos urbanísticos no âmbito das aquisições imobiliárias no Brasil, durante muitos anos, foi um tema que não despertou muito a atenção dos investidores, possivelmente, em razão de uma carência estrutural de fiscalização adequada para fazer valer as normas urbanísticas, bem como, ao próprio atraso da legislação urbanística de outrora.

No entanto, este cenário de falta de estrutura fiscalizadora e até mesmo de escassez legislativa, tomou um novo rumo desde a última década, o que faz com que os advogados que militam na área de empreendimentos imobiliários e urbanísticos devam dar cada vez mais atenção a esta matéria, a fim de que os clientes/investidores evitem adquirir imóveis «maravilhosos» à primeira vista, mas que efetivamente, não se prestam à consecução dos respectivos empreendimentos.

Antecedentes histórico e legislativo

O Brasil é um país com uma urbanização recente. Sabese que até meados da década de 40, sua população concentrava-se mais na área rural do que na área urbana.

Outrossim, as políticas desenvolvimentistas adotadas nos anos 50 e 60, assim como o «milagre econômico» dos anos 70, fomentaram o processo industrial e a migração da população rural para a zona urbana, culminando no crescimento das cidades e na necessidade de um rápido incremento de sua urbanização.

Um dos grandes avanços legislativos na área urbanística foi a aprovação da Lei Federal nº 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e trouxe critérios sistematizados para o uso e disposição do solo urbano.

Entretanto, foi somente a partir da Constituição Federal de 1988 («Constituição de 1988»), que a questão urbanística passou a tomar forma legal organizada e definida. Page 105

No bojo deste novo quadro institucional brasileiro, dentre os aspectos que dizem respeito mais diretamente aos municípios, foi também aberto caminho para a aprovação, do importante instrumento legislativo em matéria urbanística denominado Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 («Estatuto da Cidade»). Esta foi a primeira lei federal destinada especificamente à regulamentação da política urbana no Brasil.

Normativa urbanística brasileira

Competências constitucionais em matéria urbanística

A política urbana tem um capítulo especial na Constituição de 1988, pois nele está consignada a competência da União para estabelecer as diretrizes do desenvolvimento urbano. No texto constitucional está estabelecido que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre direito urbanístico, proteção da natureza e do meio ambiente, bem como, controle da poluição. E, aos municípios, a competência para legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, bem como, promover adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.Ademais, compete ao Poder Público municipal executar a política de desenvolvimento urbano, conforme diretrizes gerais fixadas em lei municipal.

Nota-se que a Constituição de 1988 assegurou uma expansão na autonomia dos municípios, que passaram a ter maior liberdade para a gestão local de sua política urbanística. Constitui-se numa determinação fundamental para permitir que os municípios possam legalmente executar uma função de ordenamento de seus espaços urbanos.

Diante disso, é importante ressaltar que no Brasil, tanto a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, podem baixar normas relativas à ordenação e desenvolvimento dos espaços urbanos, razão pela qual, alerta-se que o investidor deverá, previamente à qualquer aquisição imobiliária, verificar a legislação federal, estadual (ou distrital se for o caso) e municipal, a fim de constatar se a legislação incidente sobre um determinado imóvel, objeto da pretensa aquisição, permite que o mesmo satisfaça o escopo do empreendimento a ser desenvolvido.

Instrumentos que regulam a política urbana

Estatuto da Cidade

Trata-se de lei federal, que estabelece normas de ordem pública e interesse social que visam regular o uso da propriedade urbana em prol de um aproveitamento sustentável do espaço urbano.

Em linhas gerais, o Estatuto da Cidade regulamenta e condiciona a aplicação dos instrumentos de política urbana à existência prévia de um Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano («PDDU») e de lei municipal específica que regule a aplicação de cada um desses instrumentos.

Também determina que lei municipal definirá quais os empreendimentos e atividades, privados ou públicos, em área urbana, que dependerão da elaboração de Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança («EIV») para obter licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.

Importante mencionar que o EIV não substitui a elaboração e a aprovação do Estudo Prévio de Impacto Ambiental («EIA»), nem do Relatório de Impacto Ambiental («RIMA»), quando exigidos nos termos da legislação ambiental. Em razão disso, a legislação municipal deverá ser consultada para verificar a possibilidade do imóvel ter a utilização pretendida, sem prejuízo da verificação da legislação ambiental nos níveis estadual e federal.

Ademais, o Estatuto da Cidade enumera um rol não exaustivo de instrumentos de política urbana que são colocados à disposição do Poder Público municipal para o exercício da intervenção urbanística com o objetivo da organização conveniente do espaço urbano. Dentre as principais inovações trazidas pelo Estatuto da Cidade, destacam-se as a seguir apresentadas.

Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios

Trata-se de uma espécie de sanção aplicável ao proprietário de imóvel urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que esteja localizado em determinadas áreas, de acordo com a legislação municipal específica.

Em vista disso, o Poder Público municipal tem a possibilidade de editar lei específica para compelir o proprietário a fazer uso adequado de sua propriedade urbana, estabelecendo prazos e condições para que, ele próprio, promova o parcelamento Page 106 (mediante desmembramento ou loteamento), a edificação do imóvel, ou para que lhe dê utilização, habite-o, venda-o ou alugue-o.

Este instrumento apresentado pelo Estatuto da Cidade visa combater a especulação imobiliária, considerada contrária ao desenvolvimento da cidade. Exemplo disso, seria o caso de um investidor imobiliário que adquira uma área com o...

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