Alguns criterios basicos de estandardizaçào lingüística

AutorJoao José Santamaría Conde
CargoSecretario da Comissao para a Integraçao da Lingua da Galiza no Acordo da Ortografia Simplificada (Rio de Janeiro)
Páginas133-137

    Texto original: «Alguns criterios basicos de padroniznçao lingüística. NÓS, Revista Internacional Galaicoportuguesa de Cultura. Núm. 4/5/6, Braga (Portugal)-Poflte-vedra (Galiza), setembre 86/março 87.

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A unificaçao do idioma galego, para melhor possibilitar a sua utilizaçào nos ambitos cul tos, ainda é hoje urna questao pendente. E o é mais se temos em conta que nem sequer os proprios «normadores» oficiais sao íieis aos criterios e normas que pregoam.

Por circunstancias derivadas da guerra civil espanhola (1936-1939), nào foi possivel que frutíficassem os intentes unificadores e regeneradores do galeguismo de pré-guerra ao respeito, de maneira similar a como no mesmo tempo se unifica, v. gr., o catalao. Em todo o caso, a experiència indica que urna tarefa de tal envergadura nao se improvisa. A mesma unificaçào do catalao no lo indica. As Normes Ortogràfiques que impulsarà Pompeu Fabra, engenheiro industrial e professor de química, aprovada» polo Institut d'Estudis Catalans o 1913.01.24, nao seriam plenamente aceites até quase dous decenios mais tarde, mediante o Acord de Castelló em dezembro de 1932.

Na Galiza, a Real Acadèmia Galega começou o seu Dicionario, desde 1913 até 1928, sem que passasse do vocabulo «Cativo». Pois bem, consoante com a decisao de 1906.04.26, acordara-se redigilo segundo a ortografia etimològica.

Nesta altura, segundo o estado da norrnalizaçao do idioma galego, os nao gramaticos devemos nao prescindir dò nosso contributo mediante o emprego, em galego, das linguagens especializadas que correspondam. Todo o que se faça neste terreno, se ao menos se faz medianamente bem,

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permitira ir superando estereis confrontos em matèria ortogràfica, mediante a progressiva substituiçao da disputatio prevalecente pola dilucidatio pendente.

Criterios basicos em fraseologia e lexico

Sem animo de sermos exaustivos vamos, em primeiro lugar, explicitar alguns criterios operativos a ter em conta quando do que se trata é precisamente de exprimir, em galego, ideias ou conceitos ja cunhados, melhor ou pior, em outros idiomas polo simples fato de se tratar de linguas normalizadas e nao minorizadas.

Todos os filologos do mundo concordam em que qualquer modalidade lingüística é igualmente útil para expressar tanto as categorias filosoficas mais complexas como os sentimentos mais profundos. Em conseqüència a dificuldade nao està nas linguas, senao no dominio nio perfeito que delas tenham os seus falantes, como na insuficiente normalizaçào das mesmas.

Postos a assinalar uns minimos criterios de normalizaçào que nos permitam, em qualquer momento, exprimir todo aquilo que se deseje, diremos que cumpre ter em conta, entre outros, os seguintes:

  1. ) Que convem sempre procurar, na lingua que se trate, os neologismos ou frases necessarios para cunhar conceitos e ideias que resultem novidosos, em evitaçao de mimetismos inuteis, tratese de emprestimos ou de decalques.

    Particularmente, devemse evitar os emprestimos conotativos do tipo: party, por juntança ou reuniao; fazer shopping, por ir de compras, como quando seja possivel, os de tipo denotativo: clearing, por compensaçao (de debitos e creditos reciprocos), hardware, por suporte material ou fisico, ou software, por suporte logico.

    No tocante aos calcos, sao tambem evitaveís os do tipo «cumbre» em espanol, por reuniao, encontro, entrevista ou conferencia quando, polo proprio contexto, ja sabemos que é de alto nivel (summït meeting). Ütilizar a forma vulgar «cumio», que tambem serve para identificar a parte mais «cimeira» dum dado telhado, por «cume» (à angloespanhola) ou mesmo «cimeira», como em portuguès, ressurte duplamente inadequada no referente a qualquer summit meeting ou suntmit conference.

  2. ) A tradiçao é um excelente elemento a ter em conta. Àgora bem, nao se deverao habilitar formas em desuso quando existem ja termos modernos, evoluidos ou nao, de tais formas, pois a tradiçao subsiste e, por tanto, nào é preciso recuperala. Nao se é mais medievalista, por exemplo se se recupera «contia» por «quantia» ou «titor», «titoria» por «tutor» e «tutoria».

    Quando uns determinados vocabulos sinonimos fazem referència, respec-

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    tivamente, a algo preterito e actual, faremos uso, do primeiro, só quando nos refiramos a tempos passados e, do segundo, se nos atemos a algo presente. E assim, no tocante aos fedatarios publicos, diremos: «tabeliao» se, na historia, fazemos referència aos da Idade Media. Para os de hoje, temos «notario publico» ou «registador».

  3. ) Adoçao, de entre as soluçóes possiveis, de aquelas que apresentem maior capacidade derivativa, em aras dà maior expressividade do idioma que se trate (Norma R 704, de abril de. 1968, da Organteaçao Internacional de Estandardizaçao: ISO, na forma inglesa).

  4. ) Em aras do menor cripticismo possivel, o sentido literal tem de reflectir os carateres da noçao a denominar. Em todo o caso nao os deve contradizer. Deste modo, sobretudo na linguagem administrativa, jornalistica ou de divulgaçao científica, serà sempre maior a compreensào, dum dado texto, no caso de nao especialistas (Norma iso/r 704).

  5. ) Evitaçao da sinonímia na medidà em que propicia impressoes erroneas a respeito das diversas noçòes (Norma iso/r 704) e da polissemia, num dado contexto, ao promover certos equivocos.

  6. ) Tambem é de utilidade, na fraseologia e lexico tecnico e cientifico, como o principio anterior, o seguinte:

    Perante a necessidade de exprimir urna noçao ou termo nascidos inicialmente em outro idioma, resultarà sempre mais conveniente a adoçao de um neologismo de significado, mediante a habilitació de algum dos sinonimos se existem, do que criar prescindiveis neologismos de forma.

    Falar, por exemplo, na linguagem jurídica de: «no marco» da legislaçào bàsica, de referència, ou do artigo..., por vez de: «no quadro...», resulta, em galego, de clara antijuridicidade, O desejavel é sempre que se regulamente e regule «dentro» da lei e nao «na borda», «na beira» ou «à margem» da legalidade. Em principio, em galego: «no marco» nao significa, como em espanhol: «dentro» de tal «quadro» legal de referència, senào simplemente «na margem».

  7. ) Nao realizaçào de alteraçoes, num dado termo, modificando o seu significado habitual, sempre que sej'a possivel a habilitaçào de outro mediante un neologismo de forma e significado.

    Chamar-lhe «beira», abreviamento de «beiravia», ao «arcén» (em espanhol) das estradas supoe confundir o que esta mais à sua beira: as «bermas» («cunetas» em castelhano) com a parte lateral do piso de tais estradas. Dado que estamos no «bordo», o seu feminino: «borda» constituí urna soluçao comumente valida tanto para o galego como o é para o portuguès.

    Do que se trata, com este principio, é de evitar qualquer ambiguidade (Norma iso/r 704).

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  8. ) Quando um termo ou noçao esta ja" minimamente consolidació, nao se devera mudat por outros, salvo que existam razóes solidas e razoa-veis possibilidades de mudança (Norma iso/r 704). Tal é o caso da desne-cessaria substituiçao, em galego, da sigla IVA por ive, como veremos mais adiante.

  9. ) Em todo o caso, a adoçao dum neologismo tem de reaíizarse mediante a sua difusao e aceitaçao polos sectores sociais ou profissionais afectados, tal com se faz, por exemplo, na Oficina da Lingua Francesa do Quebeque. Em troca, na Galiza, um mesmo redator ou tradutor redige, em galego (?) um texto de mineralogia do que um formulario administrativo, sem assessoramento algum dos especialistas correspondentes.

  10. ) Quando se trate de idiomas minorizados, as noçóes comuns a outras linguas dever-se-ao cunhar tendó em conta nào só a domi nan te ou dominantes de referència. No caso do galego: o castelhano e, mesmo ao seu través, o francès ou, sobretudo, o inglès como o brasileiro e o portuguès. A volta ao latim e ao grego continua a ser urna fon te inestimavel em matèria de neologismos.

A sigla «IVA»

Esboçado o sobredito decalogo, vamos tomar o exemplo mais padadigmatico, sem duvida, que evidencia, como nos ambitos oficiais e oficiosos da Galiza, nao se acostuma a ter em conta as pertinentes recomendaçoes e criterios de validez internacional, alem do que se passa tambem em outros idiomas ibericos nao eximidos de incoerencias em matèria de estandardizaçao linguistica. E todo isto apesar de que, como ja temos indicado, na Galiza està-se teoricamente de acordo na estandardizaçao em harmonia com a de outras linguas, nomeadamente em concordancia com a família das romances e, em especial, em prol das soluçóes lusogalaicas comumente validas.1

Com posterioridade a se ter falado, tambem em galego, do iva (em espanhol: Impuesto sobre el Valor Aiíadido),2 apareceu o ive (Imposto sobre o Valor Engadido). Pois bem, esta soluçao nao somente é um de-

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calque do espanhol: «engadir» por «anadir», dada a comum raiz hispano-latina de «inaddere», senao que incumpre multiplos dos criterios de estandardizaçào lingüística antes indicades, alera de outros.

O tradutor ou tradutores, para nao serem serem traïdores, deverao de ocupar-se, como nào fizeram, de saber primeiro que é o que se entende-por «valor anadido» (em espanhol) «valor acrescentado» (em portuguès), «valor afegit» (em catalao), «value added» (en inglès) ou «valeur ajoutée» (em francès), antes de cunharem um conceito novo como es te, ou relativa-mente novidoso. Num segundo momento, ter-se-à de proceder a definir tal' conceito para, finalmente, procurar a cunhagem mais adequada.

Sem entrarmos àgora em excessivos tecnicismos, sobretudo quando-sào desnecessarios, podemos dizer que o va (em portuguès: valor acrescentado) é o resultado de aumentos quantitàtivos derivados dos processos-produtivos, tanto de fabrico como de comercializaçao. Portanto, qualquer sinonimo em «a» seria inicialmente valido, por tratar-se de urna sigla de uso internacional; e, por isso, conserva vel em galego se for possivel.

Por outra parte, como en espanhol «anadir», o «engandir» galego nao tem tantas derivaçòes como, por exemplo, «acumular» que nos permite falar de «acumulació», «acumulamento», «acumulativo» ou «acumulante». Mesmo por is to, nao é preferivel «engadir» ao nào nos permitir empregar os termos inexistentes: «engadiçao», «engadimento», «engaditivo» ou «en-gadante», frente ao ainda vivo hoje no galego: «engadir». E todo isto indicamo-lo sem animo de rejeitar «engadir», nen «engadido», termos galegos populares e locais, claramente aparentados com o do antigo catalao: «enadir» ou, do galegoportuguès também antigo: «anadir», «enadir» e «enader», do mesmo jeito que de «addere» tivemos «ader» (hoje «adir»-e o seu derivado: «adido»).3

Dado que o portuguès tem cunhada, de maneria aceitavel, a expressao: «valor acrescentado», esta forma é preferivel a qualquer outra filologica-mente admissivel: «valor aumentado», «...acumulado», «...agregado»,. «...acrescido»,...

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[1] . Vide: Revista nós, n.° 1, Braga, janeiro-abril de 1986, pag. 45. Esta afirmaçao, sob outras fortnulas similares, acha-se tan to nas propostas regeDeracionistas, dos reinte-gracionistas, como no principio 4.° das Normas para a escrita do galego, de 1982, da coautoria do Instituto da Lingua Galega (ente investigador universitario) e da Real Acadèmia Galega da Corunha (acadèmia que, segundo os seus estarutos, ainda o é de belas artes).

[2] . Vide: a pag. 70 das Conclusóes das Jornadas Tecnicas Galiza-CEE. Junta da Galiza-Parlamento Galego, 1984.

[3] . No í Congresso de Economia a Economistàs de Galiza (1986-03-06/08), aprovem-se urna conclusió referente à normalizaçao do idioma galego: «Considerase necessària a participació de economistàs no que atinge à terminologia de uso cortente tia' profissao, que corre o risco grave de ser corrompida».

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