Portugal Algumas notas sobre o contrato de trabalho com pluralidade de empregadores

AutorPaulo Ortigâo de Oliveira; José A Morim Magalhâes
CargoAbogados del Departamento de Derecho Laboral de Uría Menéndez (Oporto)
Páginas86-90

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Uma das inovaçôes consagradas no "recente" Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto de 2003, em vigor desde o dia 1 de Dezembro de 2003) consistiu na introduçâo no ordenamento jurídico português da possibilidade de um trabalhador se obrigar "a prestar trabalho a vários empregadores". Ao que julgamos saber, tratase de uma soluçâo sem paralelo em relaçâo a outros ordenamentos jurídicos.

Tal possibilidade foi instituída pelo artigo 92.º do Código do Trabalho, artigo este que nâo tem qualquer correspondência com a anterior disciplina legal da relaçâo de trabalho subordinado. Estamos, pois, perante um regime novo no campo legislativo, mas nâo perante um regime inovador no campo das relaçôes laborais.

De facto, há já algum tempo que determinadas situaçôes laborais compreendiam a existência de um trabalhador e de vários empregadores. Vejase, a título de exemplo, a situaçâo típica da secretária contratada para trabalhar num consultório partilhado por vários médicos. Ou o exemplo do motorista contratado por uma sociedade pertencente a um grupo de sociedades que, ao transportar os administradores das várias sociedades, prestava o seu serviço a todas.

Estes exemplos nâo encontravam na anterior legislaçâo laboral um regime próprio, pelo que eram enquadrados pela jurisprudência consoante as respectivas circunstâncias concretas, sendo que havia alguns autores que consideravam possível que um trabalhador prestasse a sua actividade a vários empregadores ao abrigo de um mesmo vínculo laboral. O regime do artigo 92.º do Código do Trabalho veio, por um lado, regular um conjunto de situaçôes que se verificava na prática e, por outro lado, instituir de forma expressa a possibilidade de celebraçâo de contratos de trabalho com pluralidade de empregadores.

Alteraçâo da noçâo de contrato de trabalho

Antes de nos debruçarmos sobre o regime do contrato de trabalho com pluralidade de empregadores, cremos ser conveniente tecer algumas breves consideraçôes sobre a actual noçâo de contrato de trabalho prevista no Código do Trabalho, na medida Page 87 em que a instituiçâo deste regime determinou a alteraçâo da noçâo "tradicional" de contrato de trabalho.

Antes da entrada em vigor do Código do Trabalho, a noçâo de contrato de trabalho prevista no artigo 1.º da Lei do Contrato Individual de Trabalho (Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969), definia o contrato de trabalho como sendo "aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuiçâo, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcçâo desta". Esta definiçâo foi textualmente transcrita da noçâo prevista no artigo 1152.º do Código Civil (de 1966). O Código do Trabalho, que revogou aquele Decreto-Lei, por sua vez, introduziu algumas alteraçôes a esta noçâo, definindo no artigo 10.º que: "Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuiçâo, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direcçâo destas".

Da comparaçâo entre as duas noçôes, constatae, assim, que, por um lado, caiu a referência ao tipo de actividade ("intelectual" ou "manual"), o que se compreende, pois face à realidade económica e social actual, é absolutamente irrelevante a mençâo a tal distinçâo, e por outro lado, foi acrescentada a expressâo "ou outras pessoas", sendo esta a alteraçâo mais significativa e que acima fizemos referência. Esta "simples" alteraçâo pressupôe uma mudança substancial ao nível da configuraçâo e enquadramento da noçâo do contrato de trabalho. De facto, na noçâo anterior, o contrato de trabalho era entendido como um negócio jurídico estritamente bilateral, isto é, pressupunha apenas duas declaraçôes de vontade contrapostas. De um lado tínhamos a "pessoa que se obriga a prestar a sua actividade", isto é, o trabalhador, e de outro lado tínhamos a "pessoa" que no contrato ocupava a posiçâo de credor da prestaçâo de trabalho...

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