Poder Local e Constituição na Primeira República brasileira: aspectos filosóficos e institucionais sobre a base do poder político na federação

AutorBruno Rodigheri, Carlos Alberto Pereira das Neves Bolonha
CargoUniversidade Federal do Rio de Janeiro/Universidade Federal do Rio de Janeiro
Páginas421-444
Historia Constitucional
ISSN 1576-4729, n. 23, 2022. http://www.historiaconstitucional.com, págs. 421-444
PODER LOCAL E CONSTITUIÇÃO NA PRIMEIRA
REPÚBLICA BRASILEIRA: ASPECTOS FILOSÓFICOS E
INSTITUCIONAIS SOBRE A BASE DO PODER POLÍTICO
NA FEDERAÇÃO
CONSTITUTION AND LOCAL POWER IN BRAZILIAN
FIRST REPUBLIC: PHILOSOPHICAL AND INSTITUTIONAL
APPROACHES ABOUT THE BASES OF POLITICAL POWER
IN THE FEDERAL STATE
Bruno Rodigheri
Carlos Bolonha
Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ)
SUMÁRIO: I. INTRODUÇÃO; II. ASPECTOS FILOSÓFICOS DA MATRIZ FEDERALISTA:
A CORRELAÇÃO ORIGINAL ENTRE FEDERALISMO E CONSTITUIÇÃO; III.
ASPECTOS INSTITUCIONAIS DO FEDERALISMO NA PRIMEIRA REPÚBLICA
BRASILEIRA: O ESTADO DA ARTE CONFORME A HISTORIOGRAFIA POLÍTICA;
3.1. Esmiuçando a esfera de poder local: a produção de evidências empíricas em
comparação com a historiograa política; IV. CONCLUSÃO; V. REFERÊNCIAS.
Resumo: O objeto do presente artigo gira em torno da construção dos núcleos de
poder local na arquitetura constitucional da Primeira República brasileira, reetindo
sobre a hipótese de que o município brasileiro, na forma como foi estruturado
no desenho constitucional de 1891, era peça importante na coordenação política
e social desenvolvida pelas elites políticas e atores institucionais do Brasil. Os
argumentos que sustentam a hipótese são erigidos a partir das concepções em teoria
política desenvolvidas por Hannah Arendt e James Madison, buscando interpretar
a realidade brasileira a partir das balizas teóricas oferecidas por Arendt e Madison.
A realidade brasileira, por sua vez, é abordada pelas lentes dos mais prestigiados
autores da história política nacional, tratados como “intérpretes do Brasil”, bem
como por trabalhos recentes desenvolvidos por Paolo Ricci e Jaqueline Zulini que
esmiúçam com dados empíricos a competição política dentro dos municípios na
Primeira República. A partir de tal construção teórica, o artigo oferece reexões
de matriz losóca e institucional sobre o papel dos municípios nos primeiros
momentos da república constitucional brasileira.
Abstract: The subject of this article revolves around the construction of local power
in the constitutional architecture of the Brazilian First Republic, reecting on the
hypothesis that the Brazilian municipality, in the way it was structured in the 1891
constitutional design, was an important piece in political and social coordination
in the game played by political elites and institutional actors. The main arguments
Bruno Rodigheri y Carlos Bolonha
422
that support the hypothesis are erected from the conceptions in political theory
developed by Hannah Arendt and James Madison, seeking to interpret the Brazilian
reality from the theoretical frameworks offered by Arendt and Madison. The Brazilian
reality, in turn, is approached through the lenses of the most prestigious authors
of national political history, as well as recent works developed by Paolo Ricci and
Jaqueline Zulini, which detail, with empirical data, the political competition inside of
the municipalities in the First Republic. Based on this theoretical construction, the
article offers philosophical and institutional reections on the role of municipalities
in the early stages of the Brazilian constitutional republic.
Palavras-chave: Constituição. Desenho Constitucional. Federalismo. História
política. Primeira República.
Key-words: Brazilian First Republic. Constitution. Constitutional design.
Federalism. Political history.
I. INTRODUÇÃO
Um tema que nas palavras do cientista político Gildo Marçal Brandão1 parece
condenado à reencarnação cíclica a cada conjuntura crítica que coloque em tela os
arranjos de poder no Brasil é o federalismo. Desde os tempos do Império até os dias
atuais o federalismo jamais foi via de mão única: para os mais céticos, é visto como
ferramenta de dominação oligárquica local; aos olhos mais otimistas, carrega uma
promessa de pluralismo. Divergências e convergências à parte, o arranjo federativo
é um dos pilares institucionais inseridos na constituição brasileira de 1891 – cuja
assembleia constituinte por vezes parece ter sido uma assembleia organizada para
a construção de uma federação, não de uma constituição.
É a partir da noção do federalismo como uma das linhas mestras condutoras
do desenho constitucional brasileiro que se lapida o objeto central deste artigo: a
construção dos núcleos de poder local na Primeira República brasileira e como esses
núcleos podem ser considerados peças importantes nas dinâmicas de coordenação
social e política da época. A hipótese que se desenrola na presente construção
teórica é a de que os municípios brasileiros enquanto partes componentes do
desenho constitucional do país foram peças elementares na coordenação das forças
políticas que sustentaram o arranjo institucional desenhado pela Constituição no
primeiro período republicano. Conforme anunciado no título do artigo, a hipótese
será trabalhada a partir de uma reexão de cunho losóco e outra de cunho
institucional.
Os aspectos losócos sobre o federalismo serão abordados, em essência, a
partir dos empreendimentos teóricos de James Madison e Hannah Arendt, em um
diálogo teórico que remonta as ideias primeiras que justicam a existência de um
1 BRANDÃO, Gildo Marçal. Linhagens do pensamento político brasileiro. Dados – Revista de
ciências sociais: Rio de Janeiro, vol. 48, n. 2, p. 231-239, 2005.

Para continuar leyendo

Solicita tu prueba

VLEX utiliza cookies de inicio de sesión para aportarte una mejor experiencia de navegación. Si haces click en 'Aceptar' o continúas navegando por esta web consideramos que aceptas nuestra política de cookies. ACEPTAR