Jurisprudência recente sobre o impacto em IRC das transmissões de imóveis a preços inferiores aos valores patrimoniais tributários
Autor | António Castro Caldas y Catarina Fernandes |
Páginas | 154-159 |
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Antes de entrar na análise da doutrina administrativa e da jurisprudencia disponíveis no tema em análise, cumpre fazer um breve enquadramento jurídico: (i) da relevancia, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas ("IRC"), das transmissóes onerosas de imóveis abaixo dos valores patrimoniais tributarios ("VPTs"); e, (ii) do procedimento de prova dos precos efetivos.
O artigo 64.°, n.° 1, do Código do IRC estabelece que, para efeitos de apuramento do lucro tributá-vel: uos alienantes e adquirentes de direitos reais sobre bens imóveis devem adoptar [...] valores normáis de mercado que nao podem ser inferiores aos valores patrimoniais tributarios definitivos que servi-ram de base d liquidado do imposto municipal sobre as transmissoes onerosas de imóveis (IMT) ou que serviriam no caso de nao riaver lugar d liquidado deste imposto".
Por sua vez, o n.° 2 do artigo 64.° do Código do IRC determina que, nos casos em que: "[...] o valor constante do contrato seja inferior ao valor patrimonial tñbutdño definitivo do imóvel, é este o valor a considerar pelo alienante e adquirente, para determinado do lucro tributdvel".
Ñas transmissóes de imóveis abaixo dos VPTs: "[...] o sujeito passivo alienante deve efetuar urna correçao, na declaracao de rendimentos do periodo de tributaccio a que é imputdvel o rendimento obtido com a operado de transmissao, correspondente d dfierenca positiva entre o valor patrimonial tributario definitivo do imóvel e o valor constante do contrato [e] o sujeito passivo adquirente adota o valor patrimonial tributaçao definitivo para a determinado de qualquer resultado tributaçao em IRC relativamente ao imóvel."
Para bem compreender as normas anti-abuso que regulam este regime, importa chamar á colacáo a sua ratio de mitigar os efeitos nefastos resultantes de eventuais simulacóes de precos acordadas entre compradores e vendedores.
De facto, o regime que ora se analisa visa mitigar os efeitos decorrentes da celebracáo de negocios com simulacáo de prego e nao legitima a sindicáncia, pela Autoridade Tributaria e Aduaneira ("AT"), dos negocios ou atos de gestáo praticados pelos operadores económicos.
Ora, é precisamente o enquadramento do disposto no artigo 64.° do Código do IRC como regime anti-
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-abuso e, bem assim, a impossibilidade legal da consagracáo de presungóes inilidíveis em normas de incidencia tributaria que justificam a disciplina do artigo 139.°, n.° 1, do Código do IRC que, como veremos, permite aos sujeitos passivos de IRC pro-var que os pregos praticados sao efetivamente inferiores aos VPTs.
Com efeito, o artigo 139.°, n.° 1, do Código do IRC estabelece que "se o sujeito passivo fizer prova de que o preco efectivamente praticado ñas transmissoes de direitos reais sobre bens imóveis joi inferior ao valor patrimonial tributario que serviu de base d liquidaQao do imposto municipal sobre as transmissoes onerosas de imóveis" tal impedirá a aplicacáo do disposto no n.° 2 do artigo 64.° do Código do IRC e a consideracáo do VPT como valor de realizacáo / aquisicáo, conforme aplicável.
Para esse efeito, os sujeitos passivos devem apre-sentar um "requeñmento dirigido ao director definan-cas competente e apresentado em Janeiro do ano seguinte dquele em que ocorreram as transmissoes, caso o valor patrimonial tributario já se encontré definitivamente fixado, ou nos 30 dios posteriores d data em que a avaliacao se tornou definitiva, nos restantes casos."-cfr. artigo 139.°, n.° 3, do Código do IRC.
Ao procedimento de prova dos precos efetivos apli-cam-se as regras do procedimento de revisáo da materia tributável fixada com recurso á avaliacáo indireta do rendimento (máxime, o disposto nos artigos 86.°, n.° 4, 91.° e 92.° da Lei Geral Tributaria -"LGT").
Sem prejuízo da aplicacáo das regras procedimen-tais previstas para o procedimento de revisáo da materia tributável fixada com recurso á avaliacáo indireta, é unánime, quer na doutrina quer na jurisprudencia, que a desconsideracáo do valor constante do título de transmissáo de imóveis (em aplicacáo do artigo 64.° do Código do IRC) assume a natureza de correcáo aritmética, situando-se, por esse motivo, no dominio da avaliacáo direta do rendimento.
A instauracáo do procedimento de prova do prego efectivo - o qual tem efeito suspensivo sobre a liquidacáo na parte correspondente á correcáo resultante da diferenca positiva entre o VPT definitivo do imóvel e o valor constante do contrato - cfr. artigo 139.°, n.° 3, do Código do IRC - é condicáo de procedibilidade da contestacáo, por via judicial ou arbitral, das liquidacóes de IRC que venham a ser emitidas nos termos do artigo 64.° do Código do IRC (i.e. desconsiderando os precos efetivamente praticados no apuramento das mais ou menos valias decorrentes...
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