A estranha alquimia da Cláusula Martens de 1864 até à I Conferência de Paz da Haia de 1899: Anabela Paula Brízido

AutorSeixas, Margarida ; Nogueira da Silva, Cristina
Páginas353-390
A ESTRANHA ALQUIMIA DA CLÁUSULA MARTENS DE 1864
ATÉ À I CONFERÊNCIA DE PAZ DA HAIA DE 1899
Anabela Paula Brízido1
Resumen: El contexto cultural, económico, social y jurídico del siglo XIX fue decisivo
para el diseño de la cláusula Martens en la redacción contenida en el Preámbulo de la II
Convención de La Haya sobre las leyes y costumbres de la guerra y su anexo del 29 de julio
de 1899. Diferentes actores con diferentes intereses y poderes, expresaron varios puntos
de vista sobre la guerra, la ocupación beligerante, la necesidad militar y la humanidad. Es-
tos, a su vez, fueron los asuntos que dieron lugar a la cláusula Martens. El artículo intenta
analizar cómo el contexto y los actores, con sus diferentes poderes, impactaron la cláusula
de Martens como constante en ese Preámbulo.
Palavras clave: cláusula Martens, humanidad, necesidad militar, ocupación beligerante.
Abstract: The cultural, economic, social and legal environment of the XIX century was a
critical key factor for the Martens Clause as enshrined in the Preamble of the II Conven-
tion with respect to the Laws and Customs of War on Land and its annexe: Regulations
concerning the Laws and Customs of War on Land. Signed at The Hague, of the 29 July
1899. Indeed, several actors with its interests and powers expressed different views related
to war, belligerent occupation, military necessity, and humanity. These were indeed the
grounding issues, which lead to debates of great importance for the birth of the Martens
Clause. This article seeks, therefore, to analyse how the background, several actors with

Keywords: Belligerent occupation, Humanity, Martens Clause, Military Necessity.
SUMÁRIO: I. INTRODUÇÃO; II. CONTEXTUALIZAÇÃO DA CLÁUSULA MARTENS; 1.
A equação possível entre ocupação beligerante, necessidade militar e humanidade; A. Os
conceitos de soberania e de ocupação beligerante; B. Necessidade militar; C. Humanida-
           
imprensa; III. DAS DECLARAÇÕES DE SÃO PETERSBURGO DE 1869 E DE BRUXELAS
DE 1874 À I CONFERÊNCIA DE PAZ DA HAIA DE 1899; 2. A expressão negocial vertida
1 Doutoranda em Direito na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa
(FDUNL), Investigadora no Centro de Investigação & Desenvolvimento sobre Direito e
Sociedade (CEDIS), Jurista, Mail: anabela.brizido@gmail.com. O presente artigo foi redi-
gido com elementos recolhidos durante um período de investigação no Max-Planck-Ins-
titut für europäische Rechtsgeschichte, a quem, desde já, agradeço toda a ajuda prestada
e amabilidade com que me receberam. Mais cumpre-me agradecer à Professora Doutora
Daniela Serra Castilhos e Mestre Marco Ribeiro Henriques pelos inputs dados aquando da
redação deste artigo.
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ANABELA PAULA BRÍZIDO
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
Bruxelas de 1874; F. A I Conferência de Paz e a adoção da II Convenção da Haia de 1899;
IV. CONCLUSÕES, V. BIBLIOGRAFIA.
I. INTRODUÇÃO
A cláusula Martens é fruto do seu contexto, época, local, em torno da qual
gravitaram várias dinâmicas de poder, com diferentes atores e discursos dis-
tintos2. Inserida no preâmbulo da II Convenção da Haia de 1899, referente às
leis e costumes da guerra em terra, e que, em anexo, também aprovou o seu
Regulamento com o mesmo objeto 3 (doravante designada por II Convenção

impasse diplomático ocorrido entre pequenas potências, então lideradas pela
Bélgica, e grandes potências na I Conferência de Paz da Haia de 1899 (dora-
vante designada por I Conferência de Paz).
Aquela Convenção e seu Regulamento anexo seriam revistos em 1907,
aquando da II Conferência de Paz da Haia. Dela viria, por isso, resultar a
adoção da IV Convenção relativa às leis e costumes da guerra em terra e, mais
uma vez, o seu Regulamento anexo com o mesmo objeto4.
2 Pelo que o seu campo discursivo requer o entendimento do enunciado com rela-
ção à situação em que se produz. Por um lado, pelo aferir da unicidade e singularidade
desse enunciado. E, por outro lado, pela determinabilidade da sua correlação com outros
enunciados, com os quais possa apresentar um vínculo, para assim se poder determinar
e delimitar o seu respetivo perímetro. FOUCAULT, M., L’Archéologie du Savoir, France,
(Gallimard), 1969, p. 40.
3 A II Convenção relativa às leis e costumes da guerra em terra e seu Anexo: Re-
gulamento relativo às leis e costumes da guerra em terra foi adotada em 29/07/1899,
pela I Conferência de Paz da Haia e entrou em vigor na comunidade internacional em
           
04/09/1900. Disponível em
xsp?xp_viewStates=XPages_NORMStatesParties&xp_treatySelected=150 >, [Consul-
tado em 15/01/2020] e SCHINDLER, D., TOMAN J., The Laws of Armed Conlicts : A
Collection of Conventions, Resolutions and Other Documents, Leiden / Boston, (Martinus
Nijhoff), 2004, cit., pp. 55-56.
4 A IV Convenção relativa às leis e costumes da guerra em terra e seu Anexo: Re-
gulamento relativo às leis e costumes da guerra em terra foi adotada em 18/10/1907,
pela II Conferência de Paz da Haia, e entrou em vigor na comunidade internacional
            

ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
355
Cumpre, por isso, e para melhor percetibilidade, esclarecer que a nossa
atenção irá cingir-se, com relação à cláusula Martens, ao iter percorrido des-
de, sensivelmente, a Declaração de São Petersburgo de 1868, até à adoção,
ocorrida em 29/07/1899, da II Convenção da Haia de 1899, e seu Regula-
mento anexo pela I Conferência de Paz da Haia.
Muitas questões, então, se suscitaram, mas com relevância para o nas-
cimento da referida cláusula, importando referir três: os poderes de admi-
nistração da força ocupante no território inimigo ocupado, aquando de uma
ocupação beligerante ou militar5; quem deve ser considerado combatente; e
em que termos a população pode pegar em armas para poder lutar contra o
inimigo.
Neste contexto, seria Fyodor Fydorovich Martens (1845-1909)6 (doravan-
te designado por Martens), delegado russo à I Conferência de paz, e presiden-
te da segunda comissão e subcomissão responsável, naquela Conferência, por
       
conhecido pela cláusula Martens, assim designado em “homenagem” ao seu
autor.
-
ções são vigentes, fazendo, ainda, parte integrante do direito costumeiro. Disponível em
,[Consultado em 16/08/2020] e SCHIN-
DLER, D., TOMAN J.,  -
lutions and Other Documents, cit., pp. 55-56.
5 Para efeitos deste estudo, os termos de ocupação beligerante e ocupação militar são
usados como sinónimos.
   F.F. Martens não é isenta de dúvidas por o seu nome ter sido
traduzido para várias línguas, como se pode ver em MÄLKSOO, L. «Friedrich Fromhold
Von Martens (Fyodor Fyodorvich Martens) (1845-1909)», em The Oxford Handbook of the
History of International Law, Oxford, (Oxford University Press), 2012, pp. 1-4; MÄLK-
SOO, L., «F.F. Martens and His Time: When Russia Was an Integral Part of the European
Tradition of International Law», European Journal of International Law, vol. 25, num. 3,
2014, pp. 811-829; PUSTOGAROV, V., 
and Architect of Peace, Hague, (Simmond & Hill Publishing Ltd., Kluwer Law Internatio-
nal), tradução por W.E. Butler, 2000, pp. 7-12; PUSTOGAROV, V., «Fyodor Fyodorovich
Martens (1845-1909) - a humanist of modern times», International Review of the Red
Cross, núm. 312, 1996; MARTENS, F., «La Russie et L’Angleterre dans l’Asie Centrale»,
Revue de Droit International et de Législation Comparée, pp. 227-301; MARTENS, F.,
«La Russie et l’Angleterre dans l’Asie Centrale : Réplique a M. Westlaque», Revue de Droit
International et de Législation Comparée, 1880, pp. 47-59. Da nossa parte, iremos desig-
ná-lo, para efeitos deste texto, por Martens.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
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Todavia, cumpre desde já referir, que a autoria daquela cláusula é, na
atualidade, controvertida. Martens nunca viria a reclamar a sua paternidade,
e recentes descobertas mostram a mão providencial do então Ministro belga
dos assuntos estrangeiros, Lambermont, aquando da sua redação7.
No entanto, também neste particular, esclarece-se que, para este efeito,
continuaremos a intitulá-la cláusula Martens por ser a sua designação cor-
rente.
Após a sua génese, ela foi objeto de diferentes redações e interpretações
que chegaram até à atualidade. A sua receção nos competentes textos jurídi-
cos, jurisprudência e doutrina, não tem sido, por isso, unívoca.
Se os textos jurídicos não são imunes à mudança do seu sentido durante o
seu percurso histórico, esta mesma ordem de ideias pode, em nosso entendi-
mento, ser despendido com relação ao período que antecedeu a sua génese8.
Assim, um determinado texto jurídico, quando vê a luz do dia, foi, decerto,
“recetor” do contexto cultural, social, económico e jurídico que o precedeu,
independentemente das suas futuras interpretações.
Face ao exposto, nasceu a curiosidade, e espera-se algum engenho, em
aferir dos antecedentes da cláusula Martens para perceber em que medida o
contexto em que os diferentes atores se moveram impactuaram no seu resul-

Para tanto, observou-se a complexa “galáxia” de atores a operar em dife-
rentes estruturas, com dinâmicas de poder e discursos distintos para melhor
contextualização e percetibilidade do nascimento e conteúdo desta cláusula à
luz daqueles diálogos e conceitos, enquadrados, por sua vez, no seu contexto.
Nesta procura, privilegiou-se, na medida da disponibilidade das fontes, o
estudo dos textos, diálogos, doutrina, vertidos em textos da época e na litera-
tura relevante neste assunto.
7 Assim o refere recentemente e entre outros: DAVID, É., Principes de Droit des con-
, Belgium, (Éditions Bruyland), 6.ª ed., 2019, pp. 89-90, pelo que o autor sugere
que a referida cláusula deveria, em bom rigor, designar-se por Lambermont/Martens.
8 Adere-se ao pensamento de António Hespanha, em que os textos jurídicos não são
  -
prometida a ideia da continuidade, tal não é incompatível com a tradição. O sentido do
texto trará algo que esteve na sua génese, mas sofre de alterações “fruto da diversidade dos
sucessivos contextos culturais em que a mensagem original é lida”. HESPANHA, A. M.,
    Coimbra, (Almedina editora), reim-
pressão de 2019, 2012, p. 48.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
357
II. CONTEXTUALIZAÇÃO DA CLÁUSULA MARTENS
Pese embora a cláusula Martens ter conhecido a luz do dia, como se verá,
em 20/06/1899, aquando dos trabalhos ocorridos no âmbito da sexta sessão,
da segunda subcomissão na I Conferência de Paz, não lhe foram indiferentes
os fatores económicos, culturais, jurídicos e sociais do século XIX.
As várias guerras ocorridas na Europa; a proliferação do modelo neoli-
beral assente no desenvolvimento industrial e económico; a disseminação
dos ideais nacionalistas; as correntes do romantismo, a conceção do estado
nação, resultante da revolução francesa, repercutiram-se nos conceitos de
soberania, conquista, ocupação, ocupação militar, necessidade militar e hu-
manidade. O período compreendido entre 1871 e 1914 constituiu um impor-
tante marco para o “apogeu” das leis da guerra9 e, naturalmente, para a pró-
pria construção dos conceitos jurídicos da ocupação beligerante, necessidade
militar e humanidade.
1. A equação possível entre ocupação beligerante, necessidade
militar e humanidade
Neste capítulo, pretende-se ver as tensões entre os diferentes poderes em
confronto, o seu contexto e atores, e a sua repercussão nos conceitos jurídicos
com relevância para a cláusula Martens: ocupação beligerante; necessidade
militar e humanidade.
A. Os conceitos de soberania e de ocupação beligerante
Para Girault10, o movimento de construção dos estados nação dominou a
história do século XIX. A delimitação pelos estados de fronteiras reconheci-


A necessária conscrição militar, ocorrida a partir Revolução Francesa
9 BEST, G., Humanity in Warfare, New York, (Columbia University Press), 1980,
p.129.
10 GIRAULT, R., « Guerres et sentiment national au XIX siècle», Le Bulletin de la
S.H.M.C, vol. 1-2, 1996, p. 14. A nação assentava em princípios válidos em todos os tempos
e lugares. Se a escola francesa alicerçou o seu pensamento na vontade, já a escola alemã
recorria à nação, cultura, língua e raça.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
358
(1789), fez surgir na Europa os exércitos em massa e a sua necessidade de
organização através de uma pesada máquina burocrática estadual. Um outro
ator emergiu com os seus respetivos poderes, os militares11.
Essa conscrição mudou a forma de condução da guerra (warfare) pelos
exércitos em massa. As guerras moviam agora populações inteiras a lutarem
entre si agressivamente. As muitas mortes, doentes, feridos e a impossibili-
dade da prestação de cuidados aos que deles careciam constituíam uma rea-
lidade. Por isso, os princípios humanitários costumeiros já existentes conhe-
ceram um grave retrocesso12.
Por sua vez, o próprio paradigma da ordem existente até à revolução fran-
cesa mudou. O acento tónico deslocou-se para o povo, estado nação com na-
turais repercussões para a guerra e soberania.
Esta última deixou de ser uma sucessão dinástica entre monarcas para
passar a residir no povo, pelo que a guerra, de uma luta entre aqueles e a
sua classe aristocrática, transitou para o povo. O território nacional, agora
pertença do povo, tornou-o responsável pela sua defesa, em que um dos ele-
   
o sentimento patriótico 13.
Por último, o alimento daquele sentimento centrou-se nas correntes ro-
mânticas disseminadas pela Europa, através da exaltação de heróis nacionais
e as glórias passadas. Os militares foram um dos muitos heróis nessas mes-
mas histórias14.
O monopólio do uso da força passar a ser estadual foi uma natural conse-
quência do facto de os nacionais exercerem, sob o seu comando, os poderes
dele decorrente. E se o estado era o único sujeito ou, pelo menos, o principal
sujeito de direito internacional, também teria de ser ele o centro de imputa-
ção da responsabilidade pelos atos por si cometidos e pelos seus nacionais15.
11 Segundo Ballard, a revolução francesa e a revolução americana facultariam o ma-
terial humano para estes exércitos em massa ao transformarem conceção do estado em
que a soberania passa, agora, a residir no povo. BALLARD, K. M., «The Privatization of
Military Affairs : A Historical Look into the Evolution of the Private Military Industry», em
Private Miltary and Securtity Companies : Chances, Problems, Pitfalls and Prospects,
Wiesbaden,(VS Verlag für Sozialwissenschaften), 2007, p. 37.
12 PICTET, J.S., Development and Principles of International Humanitarian Law,
Geneva, (Martinus Nijfhoff Publishers), 1985, p. 24.
13 GIRAULT, R., « Guerres et sentiment national au XIX siècle », cit., p. 18.
14 Idem, cit., p. 17.
15 RANITO, J. J., Regulating US Private Security Contractors, Switzerland, (Pal-
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
359
A regulamentação interna e internacional da violência tornou-se um pressu-
posto necessário para a determinabilidade daquela responsabilidade.
A Europa do século XIX também foi rica em diferentes correntes de pen-
samento que nela coabitavam, se confrontavam, o que se fez repercutir na
    -
mente, os de guerra, soberania e ocupação beligerante.
O facto de a soberania residir no povo não afastava dúvidas em relação
ao que por ela se havia de entender: um poder absoluto, ilimitado ou mais
restrito? Por sua vez, se o poder bélico era do monopólio estadual, qual o


podem ser direcionadas contra qualquer alvo ou apenas contra os que enfra-
quecem o poder militar do inimigo? Qual o critério para a determinabilidade
das operações militares legítimas? E porque a ocupação garantia o êxito da
campanha, quais os poderes de administração que poderiam ser exercidos
pela autoridade ocupante perante o governo inimigo deposto? Poderes ilimi-
 
Qual a proteção a dar à população no território ocupado pela força ocupante?
Quem é que deve ser reconduzido à categoria de combatente?
Os estados não deram, como se verá, respostas uniformes relativamente às
questões elencadas e que estiveram bem presentes nos trabalhos conducentes
à Declaração de Bruxelas de 1874, e na I Conferência de Paz.
Para além dos diferentes entendimentos estaduais tidos face a estas ma-
térias, outros importantes fatores contribuíam para a falta de consenso. Com
efeito, a própria percetibilidade daquelas questões oscilava em função do
complexo sistema balanço de poderes então vivido na Europa. Por último, os
grave Macmillan), 2019, p. 28. CRAWFORD, J. R., Brownlie’s Principles of Public Inter-
national Law, Oxford, (Oxford University Press), 8ª ed., 2012, p. 540. SILVA, C. N. d..
«Como contar a história dos Direitos Humanos na Europa: Algumas questões metodoló-
gicas» em Direitos fundamentais e soberania na Europa: História e atualidade, Lisboa,
   
francesa e o liberalismo oitocentista apresentaram uma rutura com o direito natural e,
consequentemente, com a conceção dos direitos previamente existentes à humanidade por
ser estabelecida uma ligação entre direitos humanos e cidadania. Nesta forma de conceber
as coisas, “só os membros da Nação podem ter direitos” e, acrescentamos nós, deveres,
pelo que importava determinar quem eram aqueles membros para determinar e evitar,
entre outros, a responsabilidade estadual pelos seus atos.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
360
conceitos de soberania e guerra16 conheceram importantes alterações, o que
se repercutiu noutros importantes conceitos com eles interligados.
    
conceito da soberania então em construção17.

socorremo-nos da resolução de 02/09/2003, do Institut du Droit Internatio-
nal, que elenca os principais princípios a serem respeitados pela força ocu-
pante em matéria de exercício dos seus poderes de administração e deveres
para com os habitantes18.
Para além de referir não haver lugar à transmissão da soberania sobre o
território ocupado, determina, ainda: a afetação dos recursos existentes no
território tem como limite a administração corrente, a satisfação das neces-
sidades dos habitantes e a salvaguarda da segurança e ordem pública, nela
se incluindo a proteção do património cultural, histórico e das infraestrutu-
ras essenciais. Por último, devem ser garantidos os direitos dos habitantes
vertidos pelos Direitos Humanos e Direito Internacional Humanitário, cujo
conteúdo mínimo consta no artigo 75 do I PA e, ainda, o artigo 42 da IV Con-
venção relativa às leis e costumes da guerra em terra e seu Anexo de 18 de
outubro de 190719.
Pelo exposto, afere-se que os dois núcleos de matérias importantes na ocu-
pação beligerante são: os deveres da força ocupante, com os seus poderes de
administração, e a proteção dos habitantes e sua propriedade.
Da resolução supra referida resulta, ainda, a natureza temporária da ocu-
pação beligerante e a necessidade de um controlo efetivo sobre o território
ocupado pela força ocupante, tratando-se, assim, de uma “vicissitude que ga-
rante a continuidade do estado”20.
Na atualidade, o artigo 2/4 da Carta das Nações Unidas consagra o princí-
16 KISSINGER, H., World Order, New York, (Penguin Books), 2015, pp. 76-82. MA-
CHADO, J. E. M., Direito Internacional: Do Paradigma Clássico ao Pós-11 de Setembro,
4.ª ed., Coimbra, (Coimbra editora), 2013, pp. 83-87.
17 BENVENISTI, E., «The Origins of the Concept of Belligerent Occupation», Law
and History Review, vol. 26, núm. 3, pp. 621-622.
18 INSTITUT DE DROIT INTERNATIONAL, Bruges session, Bruges Declaration on
the Use of Force, 02/09/2003. Disponível em
es-2003/?post_type=publication> [consultado em 20/01/2020].
19 Idem, cit., p. 2.
20 Conforme MACHADO, J. E. M., Direito Internacional: Do Paradigma Clássico ao
Pós-11 de Setembro, cit., p. 255.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
361
pio da proibição do uso da força, dela se excecionando, todavia, as situações
contempladas no seu artigo 51, que são a legítima defesa e, eventualmente, as
intervenções humanitárias.
          
 -
lação às res nullius  -
rente21
tem, ao contrário do que sucede com a ocupação beligerante, uma natureza
temporária.
   
   
um determinado território desde que a guerra se iniciasse em conformidade
com os respetivos pressupostos e que, na altura, eram diminutos. Com ela,
podia ocorrer a anexação completa de todo um território estadual, em que a
soberania passaria para o estado sucessor. A partir de 1945, a tendência é de
não ver na conquista um fundamento legítimo para a aquisição de direitos
territoriais, mesmo que aquela tenha ocorrido em situações de legítima de-
fesa22.
Nem sempre o conceito da ocupação militar foi isento de dúvidas. Como
refere Oppenheim, seria a partir do século XVIII que se começariam a notar
as diferenças entre, por um lado, a ocupação militar de natureza temporária
e, por outro lado, a real aquisição do território por conquista e subjugação23.
Além disso, por implicar um controlo sobre o território ocupado, questio-
nava-se, então, a partir de que momento se deu a ocupação. Também, neste
particular, existiam desentendimentos.
As pequenas potências pretendiam que os requisitos fossem bastante exi-
gentes por lhes permitir a resistência da população até um momento mais
tardio, já as grandes potências visavam justamente o contrário.
21 BAPTISTA, E. C., Direito Internacional Público, vol. II, Sujeitos e Responsabilida-
de, Lisboa (Associação Académica da Faculdade de Direito editora), reimpressão de 2004,
2015, pp. 267-269.
22 Idem, cit., pp. 264-267 e, entre outros, já neste sentido LAUTERPACHT, H., «
Règles générales du droit de la paix », Recueil de Cours, vol. 62, 1937, pp. 110-111.
23 OPPENHEIM, L., International Law : A Treatise : War and Neutrality, London,
(Longmans, Green, and Co.), 1906, p. 168. Na verdade, já Vattel teria notado a diferença
no seu § 159. VATTEL, E. de, O direito das gentes, Brasília, (Instituto de pesquisa de re-
lações internacionais, Universidade Brasília editora), tradução Vicente Marotta Rangel,
2004, pp. 301-302.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
362
Determinantes para a regulação desta matéria foram os pensamentos de
Heffter e Fiore-
mento, anexo à IV Convenção, relativa às leis e costumes da guerra adotada,
como referido no início, em 18/10/1907, na II Conferência da Paz.
Heffter viria com a sua unmittelbare folgerung (conclusão imediata) de-
terminar um novo princípio aplicável às leis da guerra. Esta, quando condu-
zida entre nações civilizadas, não deveria ter como objetivo a destruição total
       -
tada e visar, sempre, o restabelecimento da paz. Com esta fórmula, Heffter

e a ocupação beligerante24.
Todavia, seria Fiore a fornecer as bases para o princípio da preservação
da soberania, por sua vez, assente na ideia de nação resultante da revolução
francesa. Com efeito, se todas as nações são iguais e autónomas, então o exer-
cício da soberania sobre o seu território implica que o respetivo título territo-
rial seja respeitado e, consequentemente, não possa ser retirado à força. Para
Fiore, aquele título era similar à de uma propriedade privada, pelo que uma
eventual transmissão apenas podia ocorrer com o consentimento do visado25.
Como resulta do exposto no século XIX, os princípios inerentes à ocupa-
ção beligerante apenas eram aplicáveis entre as nações civilizadas dela se ex-
cluindo, portanto, o território colonial em que o poder do colonizador era
absoluto e em que não se reconheciam aqueles direitos aos “incivilizados”26 .
Como sobre a força ocupante impendiam, para além dos poderes de admi-
nistração, deveres de proteção da população e a sua propriedade, não podem
    Vattel,
Portalis e Rousseau.
No pensamento de Vattel, já se encontram preocupações relacionadas
com a atribuição de direitos aos inimigos que cessassem de resistir e, ainda,
preocupações com a proteção da população e sua propriedade27. No entan-
to, seria Rousseau a estabelecer o princípio cardinal do atual Direito Inter-
24 BENVENISTI, E., The Law of Occupation, Oxford, (Oxford University Press), 2.ª
ed., 2012, pp. 28-29 e BENVENISTI, E., «The Origins of the Concept of Belligerent Occu-
pation», cit., pp. 631-635.
25 Idem e ibidem.
26 BENVENISTI, E., «The Origins of the Concept of Belligerent Occupation», cit.,
pp. 631-635.
27 VATTEL, E. de, O direito das gentes, cit., pp. 485,490, 491, mais concretamente
em §§ 140, 145,147.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
363
nacional Humanitário ao fazer a distinção entre combatentes e não comba-
tentes28.
Para Rousseau, a guerra opunha os estados e não os particulares, pelo que
estes últimos apenas acidentalmente eram inimigos. Por sua vez, eram-no na
qualidade de soldados e defensores da pátria, pelo que, a partir do momento
em que um soldado baixasse as suas armas, deixaria de ser um inimigo para
passar a ser um homem em relação ao qual não se podia dispor da vida29.
Encontramos em Rousseau o entendimento do monopólio da violência
dever ser estadual e em que, por essa decorrência, o critério da distinção en-
tre combatente e não combatente passaria a assentar na identidade estadual
do sujeito, leia-se o soldado que era o combatente.
Por último, a doutrina de Portalis-Rousseau viria a consagrar o princípio
da humanidade, segundo o qual a guerra deve causar o menor dano possível e
os civis dela deverem ser poupados desde que nela não participem30.
B. Necessidade Militar
Outro importante conceito foi o da necessidade militar fortemente in-
   
que defendia o poder absoluto ou ilimitado dos estados, então designada por
raison d’État. Fruto de correntes positivistas radicais31, os seus alicerces esta-
riam assentes no nacionalismo.
No entanto, também aqui os estados tinham conceções distintas relativa-
mente à sua forma de conceber a sua raison d’État e à própria percetibilidade
da guerra. Se o poder bélico era um corolário da soberania, também teria de
ser ela a determinar a sua necessidade militar32.
28 SCKELL, S. N., « Le Droit International Humanitaire: La controverse construction
historique d’une morale universelle», Janus Net e-journal of International Relations, vol.
3, núm. 1, 2012, p. 81.
29 ROUSSEAU, J.J., Du contrat social ou principes du droit politique, s/local, (Mo-
zambook), 2001, pp. 17-18.
30 BENVENISTI, E., «The Origins of the Concept of Belligerent Occupation», cit., p.
626.
31 PEREIRA, M. d. A. d. V., Noções fundamentais de direito humanitário, Coimbra,
(Coimbra editora), 2014, p. 5.
32 Segundo Kolb, o conceito trouxe confrontos num mundo em que a raison d’État,
conceções militares e sua respetiva necessidade eram tão diferentes. O que poderia ha-
ver em comum entre, por exemplo, a conceção militar alemã, a conceção comercial anglo
ANABELA PAULA BRÍZIDO
364
O princípio da necessidade militar encontra-se, hoje, contemplado no arti-
go 22 do Regulamento anexo à IV Convenção da Haia e ínsito aos artigos 35/1
e 36 do I PA33    
os poderes das partes na opção pelos métodos e meios de guerra não serem
ilimitados34. Todavia, o referido princípio revela, também ele, um delicado
balanço entre as medidas necessárias para alcançar os objetivos da guerra e
todo o vertido nas leis e os costumes da guerra, que têm como objetivo prote-
ger a população e o seu património35.
O seu conceito é complexo por ter uma vertente positiva e negativa. Na sua
dimensão positiva, permite usar da violência, mas, na sua última vertente,
impõe-lhe restrições. O princípio da necessidade militar foi, no século XIX,
o critério referencial para a determinabilidade da legalidade dos meios de
guerra então utilizados e, consequentemente, o centro do sistema jurídico.
Com efeito, a violação da sua dimensão negativa determinou a ilegalidade
daqueles meios36.
A delimitação do próprio conceito e as teorias que tentaram subjugá-lo
também estiveram presentes no século XIX. Uma dessas teorias com impacto
assentaria na ideia de Kriegsraison geht vor Kriegsmanier, ou seja, as neces-
sidades da guerra teriam precedência com relação às leis da guerra e, por sua
vez, , nos termos em que a necessidade desconhece a lei 37.
Os combatentes passariam a ser as autoridades competentes para ajui-
zar da referida necessidade e decidiriam sobre a violação das leis da guer-
saxónica e a conceção militar mais moderada dos franceses assentes numa guerra defensi-
va e patriótica? KOLB, R., «The Protection of the Individual in Times of War and Peace»,
em The Oxford Handbook of the History of International Law. Oxford, (Oxford Univer-
sity Press), 2012, p. 8.
33 O I Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12/08/1949, relativo à Pro-
      
e iniciou a sua vigência na ordem internacional 07/12/1978. Em Portugal, o Protocolo
entrou em vigor em 27/11/1992. Conforme site do Ministério Público. Disponível em
genebra-de-12-de-agosto-de-1949-relativo-proteccao-1>, [consultado em 03/01/2020].
34 U.K. MINISTRY OF DEFENCE,  Oxford, (Ox-

35 PREUX, J., «Comentário ao artigo 35», em Commentary on the Additional Pro-
      , Geneva, (Martinus
Nijhoff Publishers, International Committee of the Red Cross), 1987, pp. 389-420.
36 KOLB, R., «The Protection of the Individual in Times of War and Peace», cit.,p. 4.
37 PREUX, J., «Comentário ao artigo 35», cit., pp. 391-392.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
365
ra38. Como se verá, esta ordem de ideias está presente na correspondência
trocada entre o militar prussiano Moltke e o Jurista Bluntschli, e no pensa-
mento do general, também prussiano, Carl von Clausewitz.
Este último (1780-1831) foi autor de uma obra póstuma, intitulada vom
Kriege (da guerra)39. Nela abordou, nos capítulos III a VII, temas clássicos
  -
40.
A interpretação da sua obra não tem sido isenta de dúvidas. Todavia, exis-

“A guerra não é apenas um ato político, mas um verdadeiro instrumento
político, uma continuidade das relações políticas, uma sua realização só que
através de outros meios”41 (tradução da nossa autoria).
Do exposto, parece resultar a relação umbilical entre a raison d’État e a
necessidade militar da guerra através da sua continuidade pelas políticas es-
taduais como seu instrumento político. A violência desconhecia limites e a
guerra passou de uma mera batalha campal para uma guerra absoluta, em
que autoridade em campo era o comandante como, de resto, sucedeu na guer-
ra franco-prussiana42.
Guerra e humanidade eram, segundo esta ordem de ideias, inconciliáveis.
No entanto, esta forma de conceber a guerra foi rejeitada pela Declaração de
São Petersburgo de 1868.
Esta teoria extremada que defendia a não regulamentação da guerra viria
a conhecer opositores. As necessidades vividas no decurso de determinadas
guerras propiciaram a sua regulamentação.
A primeira tentativa moderna de normatização da guerra ocorreu com o -
digo Lieber43, assim designado em homenagem ao seu autor, Francis Lieber44.
38 Ibidem cit., p. 392.
39 ANÓNIMO, artigo em jornal de 3 de dezembro de 1982. Disponível em
www.zeit.de/1982/49/vom-kriege> [consultado em 02/01/2020].
40 CLAUSEWITZ, C. v., Vom Kriege, Berlin, (Behr‘s Verlag), 12ª ed. ampliada de
1917, s/ano.
41 Idem, cit., p. 19.
42 Ibidem, cit., pp. 1,5,6.
43 Conhecido por Instructions for the Government of Armies of the United States
in the Field. Promulgado, em 24/04/1863, pelo Presidente Lincoln, como uma General
Order nº 100.
44 Sobre a vida e obra de Francis Lieber: VÖNECKY, S.. «Francis Lieber (1798-
1872)», em The Oxford Handbook of the History of International Law, Oxford, (Oxford
ANABELA PAULA BRÍZIDO
366
Durante a guerra civil americana (1861-1865)45, Lincoln incumbi-lo-ia de pre-
parar uma regulamentação da guerra que, após revisão, foi promulgada pelo
Presidente46.
Na sua génese, esteve a necessidade de garantir a disciplina do exército
Norte-Americano da União47, pelo que o seu destinatário é o pessoal militar.
Nele foi consagrado um conjunto de normas jurídicas e costumes, que corres-
pondiam ao direito da guerra então vigente.
-
manidade, o seu conceito ainda é muito restrito por comparação com o de-
fendido na atualidade48. Acrescente-se ao exposto o facto de o Código Lieber
ter sido elaborado durante o decurso da guerra civil norte-americana, logo a
regulamentação nele constante estaria mais vocacionada para os problemas
    -
das matérias delicadas como a ocupação e a necessidade militar.
Pese embora só ser vinculativo para os Estados Unidos, viria a ter uma
           
uma Convenção Internacional, apresentado na Conferência de Bruxelas de
University Press), 2012, pp.1-4; NYS, E., «Francis Lieber - His Life and His Work: Part I»,
American Journal of International Law, vol. 5, núm. 1, 1911, pp. 84-117; NYS, E., «Fran-
cis Lieber - His Life and His Work: Part II» American Journal of International Law, vol.
5, núm. 2, 1911, pp. 355-393.
45 HILGEMAN, W., KINDER, H., Atlas Historique : De l’apparition de l’homme sur
la terre à l’ère atomique, Paris, (Libraire Académique Perrin), 3ª ed., tradução Raymond
Albeck, 1992, p. 371.
46 Para maiores desenvolvimentos sobre os procedimentos adotados com relação ao
Código Lieber: ROOT, E., «Francis Lieber», American Journal of International Law, vol.
7, núm. 3, 1913, pp. 453-456.
47 SPIEKER, H., «Der Lieber Code», Humanitäres Völkerrecht, vol. 2, 1989, pp. 26-
27. O que permitiu a Lincoln uma disciplina à distância do seu exército por a maioria dos
combates terem, então, ocorrido em território da confederação.
48 Segundo Giladi, o Código Lieber, pela noção de guerra nele constante, defendeu
 
todo um projeto de modernização das leis da guerra no século XIX. A guerra passa, assim,
a ter uma identidade pública, ou seja, com o estado. GILADI, R., «Francis Lieber on Public
War», Goettingen Journal of International Law, vol. 4, núm. 2, 2012, pp. 455-461. Para a
conceção do conceito da humanidade, no Código Lieber: GILADI, R., «A different sense of
humanity: occupation in Francis Lieber’s Code», International Review of the Red Cross,
vol. 94, núm. 885, 2012, pp. 83-84,91-100.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
367
187449Manual de Oxford de 1880 e a II e IV Convenção
da Haia de 1899 e 190750.
Em 1880, Gustave Moynier preparou, para o Institut de Droit Interna-
cional, o Manual de Oxford enviado, por sua vez, aos estados europeus para
servir de diretriz às respetivas legislações nacionais. Nele foram compilados
            
exército não gozaria da mesma sorte por comparação com o Código Lieber51.
Isto está particularmente presente na correspondência trocada entre Mol-
tke e Bluntschli. O primeiro foi um militar alemão que participou na guerra
franco prussiana. Em carta de 11/12/1880, endereçada a Bluntschli, para se
pronunciar sobre o Manual de Oxford, existe uma passagem que revela o pen-
samento daquele militar em relação à guerra52:
“A paz perpétua é um sonho, e esta não passa mesmo de um bonito sonho. A guerra
é um elemento da ordem no mundo estabelecido por Deus. As mais nobres virtudes do

de sacrifício; o soldado oferece a sua vida. Sem a guerra o mundo estagnaria e perder-se-ia
no seu materialismo” 53 (tradução da nossa autoria).
A racionalidade do discurso de Moltke é consentâneo com o pensamento
de Clausewitz, pelo que se opôs ao conceito de necessidade militar constante
na Declaração de São Petersburgo por esta apenas permitir enfraquecer os
poderes militares do inimigo. Tal constitui, para Moltke, uma intolerável li-
mitação dos poderes militares, aquando da condução das hostilidades54. Para
ele, a autoridade militar seria a única com competência para reger a guerra
e, consequentemente, a decidir, sem restrição, sobre, entre outros, os meios,
força a empregar e objetivos militares a atingir. Assim, apenas viria admi-
tir aquelas disposições do Manual de Oxford que não colidiam com aquele
49 Martens invocou o Código Lieber aquando da Conferência de Bruxelas de 1874.
SCOTT, J.B., The Proceedings of the Hague Peace Conferences, The Conference of 1899,
New York, (Oxford University Press), 1920, pp. 505-506.
50 GILADI, R., «Francis Lieber on Public War», cit., p. 456.
51 KOLB, R., «The Protection of the Individual in Times of War and Peace», cit., p. 6.
52 MARTENS, F., «Le Manuel des Lois de la Guerre : Lettre de S.A.I. le Duc Nicolas
de Leuchtenberg et de M. de Martens», Revue de Droit International et de Législation
Comparée, 1881, pp. 309-312, criticaria esta racionalidade de Moltke.
53 MOLTKE, «Les Lois de la Guerre sur Terre», Revue de Droit International et de
Législation Comparée, 1881, cit., p. 79.
54 Idem, cit., p. 80.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
368
pensamento, tais como as matérias referentes aos feridos, doentes, médicos,
material sanitário e tratamento dos prisioneiros de guerra55.
Esta abertura, mais ou menos presente na classe militar, aliada ao poder da
-
riam uma importante porta de ingresso para a possibilidade da “humanização da
guerra”. O interesse dos próprios militares pela “preservação do seu ativo”, então
dizimados pelas atrocidades da guerra, constituiu uma importante plataforma
para a obtenção de algum consenso, concretamente, o acordo possível entre, por
um lado, aquela humanização e, por outro lado, a necessidade militar.
Em resposta, dada por Bluntschli, em 25.12.1880, aparece um outro im-
portante ator, concretamente, os juristas e estudiosos do Direito Internacio-
nal dedicados ao estudo da guerra56.
Bluntschli defendeu a criação de um Direito Internacional da guerra as-
sente em princípios aprovados pela consciência jurídica de todos os povos
civilizados, ou seja, europeus e cristãos. A proteção dos mais fracos na ocupa-
ção e a implementação e controlo daquele direito a garantir pelos estados por
disciplinarem os exércitos57.

diferentes atores. No caso, entre os militares que queriam ver salvaguardada
a sua esfera de atuação, dos próprios estados pela determinação das compe-
tentes políticas, os internacionalistas que pugnavam pela regulação da guerra
através da prestação de consultoria aos governos, aos próprios militares e,
ainda, pugnavam pela garantia do próprio comércio internacional que, natu-

    -
55 Ibidem, cit., pp. 81-82.
56 Bluntschli (1808 a 1881) foi um jurista suíço internacionalista de renome. Para
além destas objeções de Moltke, viria, ainda, a ser alvo de uma forte repreensão, ocorrida
entre 1877-1878, pela parte do general prussiano Hartmann e à qual não tivemos acesso.
O Coronel suíço Von Rustow também não o isentaria de críticas conforme se alcança,
de resto, pela sua resposta àquele Coronel. BLUNTSCHLI, J.C., «Droit de la Guerre et
Coutume de Guerre: A propos des attaques du Colonel von Rustow contre les Droits des
Gens», Revue de Droit International et de Législation Comparée, 1877, pp. 663-672. Na-
quela época, os internacionalistas prestavam consultoria aos militares e aos governos em
matéria militar. Com efeito, Bluntschli foi o representante da Alemanha na Conferência de
Bruxelas de 1876. BEST, G., Humanity in Warfare, cit. pp. 144-146.
57 BLUNTSCHLI, J.C., «Les Lois de la Guerre sur Terre», Revue de Droit Internatio-
nal et de Législation Comparée, 1881, pp. 82-84.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
369
res, concretamente, o Comité Internacional da Cruz Vermelha, os movimentos

C. -
dade civil e a imprensa
Em 1859, ocorreu a guerra franco-sardo-piemontesa contra a Áustria. Em
21/06/1859, deu-se a batalha sangrenta na localidade de Solferino, província
da Lombardia, Itália, então sob o poder do Império Austríaco58. Henry Du-
        
pelo destino dado aos feridos em combate, muitos deles em agonia e todos
entregues à sua sorte59.
Para além da falta e/ou cuidados médicos organizados, constatou a ausên-
cia da proteção às pessoas e aos próprios equipamentos envolvidos naquela
prestação. Neles incluíam-se os voluntários, pessoal sanitário, enfermeiros,
médicos, hospitais de campanha, ambulâncias e seus tripulantes.
Neste contexto, Henry Dunant escreveu um livro sobre o que presenciou e
vivenciou naquela batalha – Un Souvenir en Solferino
uma proposta para os estados organizarem, em tempo de paz, associações de
socorro, a serem patrocinadas pelos respetivos governos, com o objetivo de
auxiliar os feridos em combate e de instruírem voluntários para a prestação
de cuidados médicos em tempo de guerra60.
A então já existente Societé d’utilité publique de Genebra constituiu, em
fevereiro de 1863, um sub-comité internacional permanente para o auxílio
aos feridos de guerra e que foi o embrião para a criação do Comité Internacio-
nal da Cruz Vermelha61.
    -

importante alteração geopolítica no século XIX. HILGEMAN, W., KINDER, H., Atlas His-
, cit., p. 349.
59 Segundo Bugnion, foi a guerra mais sangrenta desde a batalha de Waterloo.
BUGNION, F., «The International Committee of the Red Cross and the Development of
the Red Cross and the Development of International Humanitarian Law», Chicago Jour-
nal of International Law, vol. 5, núm. 1, 2004, pp. 191-215.
60 DUNANT, H., A Memory of Solferino. Geneva, (International Committee of the
Red Cross), reimpressão de 1939 e 1959, sem ano, pp. 115, 116-117.
61 FORSYTHE, D. P. 
Cross, Cambridge, (Cambridge University Press), p. 17.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
370
Formado por um comité de cinco cidadãos de Genebra, entre eles, Gusta-
ve Moynier e o próprio Henry Dunant, foi abraçada a sua visão estratégica.
Entre outras iniciativas, conceberiam um plano para garantir juridicamente a
neutralidade a todos os envolvidos na prestação de cuidados médicos62.
Por conferência privada ocorrida em Genebra, em outubro de 1863, para
além de se ter decidido implementar aquele plano, ela também viria a consti-
tuir um importante marco para o início do movimento internacional da Cruz
Vermelha63.
O passo subsequente foi convencer os representantes da Confederação

em 1864, a I CG (Convenção de Genebra) para a melhoria da condição dos
militares feridos em exércitos em campanha64.
Neste particular, importa remeter para o artigo 6 daquela Convenção, por
determinar que os combatentes feridos ou doentes, independentemente da
sua nacionalidade, deveriam ser recolhidos e cuidados.
No fundo, subjaz aqui o pensamento de Rousseau
um soldado ferido, fora de combate, já não é um inimigo, mas um ser hu-
mano. Devido ao consenso assim obtido, passou a ser visto como uma regra
geral65. Pela condição do humano, expresso na pessoa, era irrelevante a nacio-
nalidade para a prestação de cuidados por todos serem dignos deles.
Outra importante inovação foi a consagração do princípio da neutralidade
com relação a todos aqueles que prestavam auxílio aos feridos e doentes, nele
se incluindo os recursos humanos e materiais afetos (ambulâncias e hospitais
de campanha).
Para além de constituir um convite para a participação dos civis nos cuidados,
a alusão expressa de que a neutralidade abrangia as próprias ambulâncias ou
hospitais de campanha disponibilizados por uma força militar, é reveladora da
importância deste princípio. Como bem refere Best, o princípio da neutralidade
   
do ideal humanitário e invadiu, corajosamente, o habitat natural dos militares66.
62 Idem, cit., pp.17-18. DUNANT, H., A Memory of Solferino, cit., p. 85. Do comité dos
cinco, fariam ainda parte Théodore Maunoir, Louis Appia, General Guillaume Henri Dufour.
63 FORSYTHE, D. P., The Humanitarians : The International Committee of the Red
Cross, cit., p. 18; DUNANT, H., A Memory of Solferino, cit., pp. 98-99.
64 A Conferência ocorreu entre 8 a 22 de agosto de 1864, nela estiveram representa-
dos 16 estados e a I CG foi imediatamente assinada por 12 estados ocidentais.
65 BEST, G., Humanity in Warfare, cit., p.150.
66 Idem, cit., p.150.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
371
         
E.U.A., também foram muito importantes por terem repercussão nas normas
jurídicas internacionais adotadas, no desenvolvimento de determinadas ins-
tituições, estas últimas, pelas suas ações despendidas, estimularam, por sua
vez, a negociação de tratados sobre arbitragem, humanitarismo e controlo de
armas67.
Cumpre destacar Bertha Von Suttner, que publicou, na altura, a sua obra
Lay Down the Arms68 e esteve presente na I Conferência de Paz. O seu des-
contentamento, perante os resultados alcançados naquela Conferência, foi
notório na época69    
paz, sendo que a conferência decorreu, ainda, à porta fechada70.
A guerra da Crimeia constituiu outro marco importante para a demons-
trabilidade do peso da imprensa junto à opinião pública. O desenvolvimento
da tecnologia, concretamente o telégrafo, e a melhoria das vias rodoviárias
permitiram uma maior rapidez na disseminação das notícias71.
A sociedade civil, agora mais informada, pressionou os governos por me-
lhores condições para os seus soldados e criticaria as políticas da guerra es-
taduais. Todavia, esses mesmos governos também se socorriam da impren-
     
guerra e, com isso, fundamentar a participação do exército nacional para os
considerados desígnios da nação72.
67 LYNCH, C., «Peace Movements, Civil Society, and the Development of Interna-
tional Law», em The Oxford Handbook of the History of International Law, Oxford, (Ox-
ford University Press), p. 16.
68 PETER, S., «Bertha Von Suttner (1843-1914)», em The Oxford Handbook of the
History of International Law, Oxford, (Oxford University Press), 2012, pp. 1-4. Por sua
vez, Bertha Von Suttner correspondia-se com Henry Dunant. DURAND, A., «The devel-
opment of the idea of peace in the thinking of Henry Dunant», International Review of the
Red Cross, vol. 26, núm. 250, 1986, p. 19.
69 Idem, cit., p. 654.
70 Esta forma pouco democrática seria, de resto, criticada por Lapradelle:
LAPRADELLE, A. G., «La Conférence de la Paix», Revue Gènérale de Droit International
Public, 1899, p. 655.
71 BENVENISTI, E., LUSTIG D., «Monopolizing War: Codifying the Laws of War to
Reassert Governmental Authority, 1856-1874», Research Paper n.º 28/2017,University of
Cambridge Faculty of Law. Disponível em ,[con-
sultado em 03/01/2020], p.7.
72 Idem, cit., p. 7.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
372
III. Da Declarações de São Petersburgo de 1869 e de Bruxelas de
1874 à I Conferência de Paz da Haia de 1899

Neste capítulo, pretende-se demonstrar o caminho percorrido, pela apre-
ciação dos textos jurídicos com relevância, até à consagração da cláusula
Martens no preâmbulo da II Convenção da Haia.
D. 
A Declaração de São Petersburgo de 1869 sobre a renúncia, em tempo de
guerra, aos projéteis explosivos com um peso inferior a 400 gramas73, verte
importantes princípios que foram retomados na Declaração de Bruxelas de
1874, na I Conferência de Paz, e inerentes, por sua vez, à cláusula Martens.
Ela é fruto do contexto diplomático, político e militar, em que o desarma-
mento militar constituía um tema central da política europeia em matéria de
segurança. Para além destes motivos, acrescem, ainda, a evolução tecnológica
    
mortíferos e do próprio aumento da dimensão dos exércitos, em que expres-
sivos recursos estaduais foram alocados à economia de guerra74.
Em 1863, foi inventado, pelas autoridades militares russas, um projétil
cuja explosão ocorria aquando do contacto com superfícies duras. O seu obje-
tivo era fazer explodir as carruagens com munições. Todavia, em 1867, foram
introduzidas alterações que permitiram a sua explosão em contacto com su-
perfícies moles, incluindo tecido humano e animal75.
O governo russo, pela pessoa do então ministro da guerra, Dmitry Milyu-
tin, preocupado com o uso futuro desses projéteis contra as tropas russas, e,
73 A Declaração foi assinada, de acordo com o calendário gregoriano em 11/12/1868,
em São Petersburgo, ao que corresponde a data de 29/11/1868, no calendário Juliano.
SCHINDLER, D., TOMAN J., 
Resolutions and Other Documents, cit., p. 91.
74 CRAWFORD, E., «The Enduring Legacy of the St. Petersburg Declaration : Dis-
tinction, Military Necessity, and the Prohibition of Causing Unnecessary Suffering and
», Journal of the History of International Law, vol. 20, p. 546 e
KOLB, R., MILANOV, M., «The 1868 St Petersburg Declaration on Explosive Projectiles:
A Reappraisal», Journal of the History of International Law, vol. 20, p. 516.
75 SCHINDLER, D., TOMAN J,   -
ventions, Resolutions and Other Documents, cit., p. 91.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
373
ao mesmo tempo, que pudessem constituir uma vantagem para as potências
utilizadoras, sugeriu ao Czar Nicolau II que a eles renunciasse 76.
O Czar, interessado na regulação da guerra, para seu melhor controlo,
convidou as grandes potências a participarem numa Comissão Internacional
-
nacional a proibir o seu uso77.
Durante as três sessões, as principais preocupações dos intervenientes
prenderam-se com o fundamento da respetiva proibição e o âmbito de aplica-
bilidade daquele documento78.
Nela, a Prússia proporia que outras proibições fossem contempladas, to-
davia com forte oposição pela Grã-Bretanha que queria, ao máximo, restrin-
gi-las. Com efeito, tudo o que atentasse, principalmente, contra o seu poder
naval, ia contra os interesses Grã-Bretanha e, por isso, inaceitáveis79.
Os diferentes interesses em jogo irão, mais tarde, ditar em Bruxelas e na
Haia os diferentes posicionamentos das potências com relação às propostas
formuladas. De São Petersburgo a Haia evidencia-se uma luta de poderes en-
       
interesses individuais.
Vejamos, agora, o que resulta do próprio texto da Declaração com força
vinculativa para os seus subscritores com relevância para a cláusula Mar-
tens. Objeto da declaração eram as guerras pelo que dela seriam excluídos
        
76 MARTENS, F. de., -
ra - La Conferencia de Bruselas - Derechos y deberes de los beligerantes, La Conferencia
de La Haya, Madrid, (La Espanã Moderna), tradutor anónimo, p. 104.
77 SCHINDLER, D., TOMAN J.,  -
ventions, Resolutions and Other Documents, cit., p. 91, KOLB, R., MILANOV, M., «The
1868 St Petersburg Declaration on Explosive Projectiles: A Reappraisal», cit., p. 521,
CRAWFORD, E., «The Enduring Legacy of the St. Petersburg Declaration : Distinction,

Injury in IHL», cit., p. 560. No entendimento da autora, a designação moderna seria de
um controlo de armas entre parceiros com igual expressão.
78 KOLB, R., MILANOV, M., «The 1868 St Petersburg Declaration on Explosive Pro-
jectiles: A Reappraisal», cit., p. 516 e CRAWFORD, E., «The Enduring Legacy of the St.
Petersburg Declaration : Distinction, Military Necessity, and the Prohibition of Causing

79 CRAWFORD, E., «The Enduring Legacy of the St. Petersburg Declaration: Distinc-
tion, Military Necessity, and the Prohibition of Causing Unnecessary Suffering and Super-

ANABELA PAULA BRÍZIDO
374
altura, a doutrina maioritária defendia a sua interestadualidade e a neces-
sidade da demonstração da intenção de a ela recorrer (elemento subjetivo)
expressa, em princípio, na respetiva declaração de guerra emitida pelo es-
tado declarante80.
Refere-se, ainda, no mesmo preâmbulo das necessidades de guerra, deve-
rem ceder perante as exigências da humanidade complementado, por sua vez,
com a proibição do sofrimento humano desnecessário, vertidos nos quartos

de a guerra não ser proibida, nem tudo podia ser permitido. Estas mesmas
palavras de “exigências da humanidade” seriam, mais tarde, incorporadas no
texto da cláusula Martens.
Todavia, a humanidade ali referenciada foi fortemente condicionada pela
utilidade militar. De resto, esta “tensão entre interesses e poderes contrapos-
tos” marcou o diálogo entre os diferentes atores do século XIX e o que se
repercutiu nos próprios textos. Com efeito, a Declaração e todos os textos
produzidos até à adoção, com relevância para caso, da II Convenção da Haia
de 1899, não tiveram como destinatários diretos os civis, apenas o pessoal
militar.
 

de combate o maior número de homens possíveis. Os civis, só pelo recurso à
via indireta, aqui podem ser enquadrados, pelo facto de alvos militares ape-
nas poderem ser os combatentes. O princípio da distinção entre combatentes
e civis encontrava-se, ainda, numa fase muito embrionária e, por isso, seria
objeto de discussões futuras.
Cotejada esta disposição com a própria Declaração de Genebra de 1864,
reforça-se o referido. Com efeito, o objeto daquela Convenção é a melhoria
das condições dos feridos num exército em campanha, ou seja, o centro da
gravidade é o combatente. A alusão aos civis apenas ocorre, na medida em
que eram necessários para prestarem auxílio aos que estavam em sofri-
mento. Com efeito, seria, ainda, necessário percorrer um longo e irregular
 -
ma81.
80 Idem, cit., p. 100.
81 Ibidem, cit., p. 534, BENVENISTI, E., LUSTIG, D., «Monopolizing War: Codifying
the Laws of War to Reassert Governmental Authority, 1856-1874», cit., pp. 1-2 que men-
ciona a ausência do envolvimento da população civil neste diálogo.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
375
A utilidade militar marcou, no seu último parágrafo, a sua insígnia com a
previsão de proibições futuras requererem novos acordos e, ainda, pela cláu-
sula si omnes ou da participação geral que nasceria neste encontro82.
A preocupação da salvaguarda da vantagem militar em relação àqueles
que aderiram à Declaração viria a ditar a solução de que os seus destinatários
eram as suas partes subscritoras em contexto de guerra, mas caso, por al-
gum motivo, se juntasse a um beligerante uma parte não subscritora do docu-

obrigações nela vertida à luz da reciprocidade.
Em nossa opinião, esta cláusula também é reveladora dos interesses
          
reforçado, ainda, pela recondução das proibições ao mínimo possível. Esta
mesma regulação seria vertida, com relevância para o caso, no artigo 2 da II
Convenção da Haia83.
Outro fator digno de registo reporta-se ao próprio entendimento relativa-
mente ao conceito da humanidade constante neste documento por compa-
ração com o vertido na Convenção de Genebra de 1864, que, em matéria de
aplicabilidade, não conheceu restrições desta natureza84.
         
guerra, por ser prestado de comum acordo com os militares, não afrontar
tanto os seus poderes militares por comparação com a proibição do uso de
um determinado tipo de arma presente na Declaração de São Petersburgo.
A utilidade militar foi o alimento em torno do qual gravitaram as discussões
entre as diferentes potências. Assim, a Declaração não viria necessariamente
humanizar a guerra, mas antes militarizá-la por forma a ir ao encontro de
85.
82 CRAWFORD, E., «The Enduring Legacy of the St. Petersburg Declaration: Dis-
tinction, Military Necessity, and the Prohibition of Causing Unnecessary Suffering and

83 KOLB, R., MILANOV, M., «The 1868 St Petersburg Declaration on Explosive Pro-
jectiles: A Reappraisal», cit., p. 530.
84 CRAWFORD, E., «The Enduring Legacy of the St. Petersburg Declaration: Dis-
tinction, Military Necessity, and the Prohibition of Causing Unnecessary Suffering and

85 SCHÄFER, R., «The 150th Anniversary of the St Petersburg Declaration: Intro-
Journal of the History of International
Law, vol. 20, 2018, cit., p. 507.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
376
E. A Declaração de Bruxelas de 1874
Na origem da Declaração de Bruxelas, estiveram questões relacionadas
com a guerra franco-prussiana (1870-1871). No decurso da guerra, a Prússia
ocupou território francês e nele se incluíram a Alsácia e a Lorena. Algumas
das competentes entidades alemãs, incumbidas pela administração do terri-
tório ocupado militarmente, decidiram revogar a legislação francesa e imple-
mentar a autoridade alemã por entenderem tratar-se de território alemão.
Esse foi o caso da Alsácia e de alguns outros territórios franceses. Com a vi-
tória da Prússia, a Alsácia e a Lorena reverteram a favor da Alemanha que,
  86. A controvérsia gerada em
torno da ocupação, em geral, e, em particular, da ocupação militar alemã em
território francês, suscitou debates intensos naquela época e, por isso, pre-
sentes na Conferência de Bruxelas.
Martens concordou com os poderes soberanos exercidos pela Alemanha
ainda em tempo de guerra e defenderia um semelhante entendimento rela-
tivamente à ocupação territorial búlgara, então parte integrante do império
otomano, pela Rússia na guerra russo turca (1877-1878) 87.
Martens, autor da proposta da futura convenção a ser adotada na Confe-
rência de Bruxelas de 1874, não perdeu de vista os interesses da Rússia face
 
ser conhecida, nos ministérios europeus, como sendo o código da conquista
por favorecer ostensivamente os poderes da força ocupante, no caso, também
os russos88.
Outro importante acontecimento ocorrido na guerra franco prussiana
e, com interesse para a época, foi a proclamação da República Francesa e a
constituição do governo de defesa nacional em 04/09/1870.
Determinado a prosseguir a guerra contra a Prússia, Léon Gambeta criou
um exército popular com guardas nacionais, uma força proletária, e por fran-
co-atiradores. Estes últimos eram voluntários irregulares, que tanto prati-
86 BENVENISTI, E., « The Origins of the Concept of Belligerent Occupation», cit., p.
640 e HILGEMAN, W., KINDER, H., Atlas Historique : De l’apparition de l’homme sur la
terre à l’ère atomique, cit., p. 347.
87 MARTENS, F. de., Tratado de Derecho Internacional Apêndice: La Paz y la Guer-
ra, cit., pp. 304-308.
88 NABULSI, K., Traditions of War: Occupation, Resistance, and the Law, Oxford,
(Oxford University Press), 1999, p. 6.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
377
cavam uma luta de guerrilha como, ao mesmo tempo, lutavam ao lado das
forças regulares89.
-
tre os prussianos e franceses. Enquanto os prussianos os viam como rebeldes
com execução imediata, os franceses entendiam tratar-se de soldados regula-
res mandatados pelo governo.
Königlicher Preussischer Staats-An-
zeiger90, a Prússia viria a indicar os requisitos para reconhecer os franco-ati-
radores como combatentes regulares: autorização escrita do governo francês
para poderem participar nas operações militares; estar sob o comando dos
-
cês. Eram requisitos impraticáveis contra os quais a França reagiu91. Pelo ex-
posto, também a atribuição do estatuto de combatente regular foi um assunto
abordado na Conferência de Bruxelas de 187492.
Mais uma vez, foi a Rússia a ter a iniciativa de convocar uma Confe-
rência93. Todavia, aquela não foi bem aceite pelas potências de então. As
pequenas potências tinham justo receio de que as práticas de ocupação im-
  
  -
quista russo. Já a Prússia queria preservar o novo status quo, obtido com a
vitória na guerra franco prussiana, e, por isso, tinha conveniência de que as
leis da guerra continuassem por redigir, razão pela qual Bismarck nela não
89 BENVENISTI, E., LUSTIG, D., «Monopolizing War: Codifying the Laws of War to
Reassert Governmental Authority, 1856-1874», cit., p. 18.
           
em [consultado em
04/01/2020].
91 MARTENS, F. de., Tratado de Derecho Internacional Apêndice: La Paz y la Guer-
ra, cit., p. 495.
            
27/08/1874.
93 SCOTT, J.B., The Proceedings of the Hague Peace Conferences, The Conference
of 1899, cit., pp. 505-506. Na I Conferência de Paz, Martens   
Conferência de Bruxelas pelo Czar Nicolau II. Era imperioso adotar leis que regulassem
a guerra em tempo de paz “quando as mentes e paixões das pessoas não se encontram
        Código Lieber e que, em muito,
inspiraram o próprio Martens.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
378
participou94. Na conferência, participaram 15 estados e, ao todo, 32 repre-
sentantes.
Esclareça-se que a conferência não teve como objeto todos os assuntos
com relação à guerra, mas apenas alguns. E, por sua vez, o draft -
jeto de convenção afastou-se consideravelmente do projeto originário russo,
tornando-o mais favorável às pretensões das pequenas potências95.
Três foram os grandes núcleos de questões então abordados com naturais
desacordos e tensões face aos interesses em presença.
 
há que ter em mente que, durante o seu decurso, a população não podia resistir.
Assim, as potências ocupantes pretendiam vê-la imediatamente reconhecida e
com os menores requisitos possíveis. Já os ocupados, pela consagração de requi-
sitos mais exigentes, tais como a necessidade da subjugação total da população e
uso contínuo da força pelo ocupante pretendiam retardar no tempo a proibição
da resistência populacional para poderem exercer os seus plenos poderes96.
O segundo encontra-se relacionado com o primeiro pela noção a dar aos
combatentes regulares. Quem é que podia legitimamente pegar em armas e
combater?
As grandes potências, socorrendo-se das noções clássicas, entendiam po-
derem ser apenas os militares, pelo que os civis que lutassem eram vistos
como ladrões, rebeldes e, por isso, alvos a serem sumariamente executados;
este, de resto, era o entendimento da Prússia com relação aos franco-atira-
dores. Contrário, como se compreende, foi o posicionamento das pequenas
potências para as quais qualquer nacional que usasse de armas para defender
a nação era um combatente regular e, por isso, não deveria ser alvo de repre-
sálias quando capturado97.
Este discurso estender-se-ia ao levée en masse, em que as forças ocupan-
tes pela imposição de requisitos especiais, organizacionais e espaciais pre-
tendiam reduzir o seu peso. Assim, exigiam que a população apenas pudesse
pegar em armas para lutar contra o invasor se ocorresse em território não
ocupado e mediante uma invasão inesperada. Naturalmente que as pequenas
potências refutavam aquelas restrições 98.
94 NABULSI, K., Traditions of War: Occupation, Resistance, and the Law, cit., p. 6.
95 Idem, cit., pp. 92-93.
96 NABULSI, K., Traditions of War : Occupation, Resistance, and the Law, cit., p. 18.
97 Idem, cit., p. 17.
98 Idem, cit., pp. 17-18.
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O terceiro reportou-se às represálias, impostos e requisições. As grandes
potências queriam poder ilimitado para o fazer, já os ocupados abominavam
as represálias e defendiam critérios legais para a tributação e requisição civil
para evitar a sua arbitrariedade99.
         
Depois da Conferência de Bruxelas, o Institut de Droit International incum-
bir-se-ia de fazer um estudo sobre aquele projeto; nele participaram, entre
outros, Jaequemins, Martens e Moynier100.
As questões deixadas em aberto careciam de resposta que foram, mais
uma vez, retomadas na I Conferência de Paz. Todavia, o concerto europeu de
poderes conheceu, durante aquele hiato de tempo, alterações consideráveis.
O mundo de 1874 não era o mesmo por comparação com o de 1899.
  
o reforço da sua capacidade militar, entre outros, com a aquisição de arma-

F. A I Conferência de Paz da Haia e a adoção da II Convenção da Haia
de 1899
O Czar Nicolau II, através de duas circulares, convocaria os estados
para participar numa conferência. Segundo Lapradelle, uma primeira em
12/08/1898, onde propôs um objeto mais abrangente para a conferência,
   
  
segunda circular, de 30/12/1898, cingiu-se a conferência ao desarmamento
e à arbitragem101. Anexa àquela, e com interesse para o caso, foi o projeto
99 Ibidem, cit., p. 19
100 INSTITUT DE DROIT INTERNATIONAL, «Travaux préliminaires a la session de
La Haye 1874-1875 ; Quatrième Commission – Conférences de Bruxelles Règlementation
des lois et coutumes de la guerre», Revue de Droit International et de Législation Com-
parée, 1876, pp. 438-529.
101 LAPRADELLE, A. G., «La Conférence de la Paix», cit., p. 657 e PILLET, A.,-
FAUCHILLE, P., «La question du désarment et la note du Tsar Nicolas II», Revue Gè-
nérale de Droit International Public, 1898, p. 687. Como Martens admitiu, foram da sua
autoria as alterações à segunda circular por não comprometerem tanto o êxito da con-
ferência. PUSTOGAROV, V., Our Martens: FF. Martens International Lawyer and Ar-
chitect of Peace, cit., pp. 164-166. MARTENS, F. de., Tratado de Derecho Internacional
Apêndice : La Paz y la Guerra, cit., p. 98.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
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    
de trabalho matriz para a regulamentação das leis e costumes da guerra em
terra102.
Neste contexto, apesar de a I Conferência da Haia ser designada por paz,
ela teve, em bom rigor, como objeto a regulamentação da guerra e a resolução
de litígios pela arbitragem. Não foi totalmente inocente a escolha destes dois
tópicos e, com ela, visava-se, pelo menos, tentar passar a ideia de que seria
possível conciliar o melhor dos dois mundos.
Com a normatização jurídica da guerra e o desarmamento, pretendeu-se
ir ao encontro das expectativas das potências, interessadas em controlarem-
se reciprocamente. Já a arbitragem pretendeu cativar a opinião pública e os
-
   
daqueles grupos junto à população103.
Na conferência que decorreu no período compreendido entre 18/5/1899 a
29/06/1899, participaram 26 estados104. Os trabalhos a realizar foram distri-
buídos por três comissões. À segunda comissão, constituída por uma subco-
missão, coube-lhe, entre outras matérias, rever a Declaração de Bruxelas de
1874, referentes aos usos e costumes da guerra105, ambas presididas por Mar-
102 PUSTOGAROV, V.,     -
chitect of Peace, cit., pp. 164-166. MARTENS, F. de., Tratado de Derecho Internacional
 cit., p.98. O texto da segunda circular, efetivamente, des-
tacaria a vertente do desarmamento cujo teor pode ser consultado em SCHINDLER, D.,
TOMAN J.,   
Other Documents, cit., p. 41.
103 PUSTOGAROV, V., -
tect of Peace, cit., pp. 164-165. Apesar de não podermos ajuizar sobre as reais intenções de
Martens, não deixa de ser um facto que aqueles interesses se encontravam em presença na
época e, por isso, havia que arranjar uma forma de os articular entre si.
104 Áustria-Hungria, Bélgica, Bulgária, China, Dinamarca; França, Alemanha, Grã-
-Bretanha. Grécia, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Montenegro, Países Baixos, Pér-
sia, Portugal, Roménia, Rússia, Sérvia, Sião, Suécia e Noruega, Suíça, Turquia e E.U.A..
SCHINDLER, D., TOMAN J., 
Resolutions and Other Documents, cit., p. 43.
105 SCOTT, J.B., The Proceedings of the Hague Peace Conferences, The Conference
, cit., pp. 18-19, conforme deliberação tomada em 20/05/1899, na segunda sessão
plenária e da qual ainda resulta cada estado ter apenas um voto nas sessões plenárias e
nas comissões.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
381
tens106
após respetiva aprovação na comissão e subcomissão.
Na origem do impasse diplomático entre pequenas e grandes potências,
estiveram os capítulos I, II e IX da Declaração de Bruxelas, que regiam respe-
tivamente: a autoridade militar sobre território hostil (artigos 1 a 8); quem é
que devia ser reconhecido como beligerante: combatentes e não combatentes
(artigos 9 a 11), e os impostos e requisições civis (artigos 40 a 42)107.
Os pequenos estados, agora representados pela Bélgica, pretendiam a res-
trição daquela autoridade, uma maior amplitude do conceito de combatente
e a menor carga com impostos e requisições civis, já as grandes potências
pretendiam o inverso. Estavam, assim, lançados os dados para um confronto
de poderes entre pequenos estados e grandes potências. Esse confronto deu-
se, principalmente, através da Grã-Bretanha a apoiar as pretensões belgas, e
a Alemanha e Rússia a defender os interesses das grandes potências.
Em bom rigor, o ponto de partida já tinha sido debatido noutros fóruns
da época. Na conferência de Bruxelas e nas sessões do Institut de Droit In-
ternacional, questionou-se sobre a possibilidade, conveniência e utilidade de
regulamentar juridicamente, mediante preceitos concretos, a guerra108.
O delegado belga defendeu a sua não regulamentação, com uma conse-
quente remissão para as leis das nações civilizadas, por mais vaga que pudes-
se ser. Vejamos em que moldes, ainda que sumários, o fez.
No seu entendimento, foi pretensão da conferência de Bruxelas, quanto à
ocupação militar, os vencidos reconhecerem previamente aos invasores de-
terminados direitos vertidos no projeto da futura convenção sobre o seu pró-
prio território e proibir o envolvimento da população na guerra109.
Apesar de reconhecer as vantagens decorrentes da existência de uma re-
gulamentação para a salvaguarda da ordem civil e proteção das populações,
declina-a por questões de ordem moral e patrióticas110.
106 Idem, cit., p. 21 deliberação tomada em 23/05/1899, na terceira sessão plenária.
107 Ibidem, cit., p. 502 deliberação tomada em 06/07/1899, na sexta sessão da se-
gunda sub-comissão e SCHINDLER, D., TOMAN J., -
lection of Conventions, Resolutions and Other Documents, cit., pp. 25-26.
108 INSTITUT DE DROIT INTERNATIONAL, « Travaux préliminaires à la session
de La Haye 1874-1875», cit., pp. 441-450. Em resposta ao delegado belga, Martens referiu
The Proceedings of the Hague
, cit., p. 506.
109 Idem, cit. p. 502.
110 Ibidem, cit., p. 503.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
382
Com relação à ocupação, impostos, requisição civil e penalidades, aquele
delegado fundamentou a indesejabilidade de um tratado por aquele represen-
tar, para as pequenas potências, um reconhecimento e consentimento escrito
e prévio dos direitos das forças ocupantes. Na eventualidade das grandes po-

reconhecimento dos atos abusivos perpetrados pela força ocupante aquando
da ocorrência de uma invasão.
Já com relação à determinabilidade dos beligerantes (combatentes e não
combatentes) e a população poder pegar em armas para defender o país, o
argumento assentaria, ainda, no patriotismo e localização do território belga.
O cidadão tinha o dever patriótico de pegar em armas e a posição do território
 
os invasores111.
           -
mento de alguns preceitos no texto base, que, em termos práticos, restrin-
giam os poderes da força ocupante.
Neste encalço, a resposta de Martens foi nitidamente direcionada para a
plateia composta pelos mais diferentes atores e seus respetivos interesses.
Por um lado, as pequenas e as grandes potências logo ali presentes e, por ou-

É assim uma retórica combinada entre uma exortação ao poder bélico das
grandes potências temperado, o quanto baste112, pela humanidade, justiça e
direito, para assim acomodar a pretensão das pequenas potências, dos movi-

Naquela sessão, Martens reitera a necessidade expressa pela adoção de
uma legislação que consagre a regulamentação da guerra113.
O discurso prossegue, como referido, pela dialética entre os interesses mi-
111 Ibidem, cit., pp. 504-505.
  
Clause», European Journal of International Law, vol. 25, núm. 3, 2014, pp. 847-869.
Na perspetiva do autor, tratou-se de um discurso calculista e que nunca perdeu de vista
os interesses do império russo então em expansão. Pese embora não termos tido acesso a
todos os elementos necessários para emitir opinião, denota-se, efetivamente, uma maior
preponderância no discurso para os poderes da força ocupante em que a humanidade é
apenas admitida, na medida em que com ela não colida.
113 SCOTT, J.B., The Proceedings of the Hague Peace Conferences, The Conference
of 1899Martens coloca a tónica nos deveres dos mais fra-
cos ao referir “(…) se os deveres destes últimos (mais fracos) não forem reconhecidos (…).
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
383
   Martens levanta
a hipótese de não ser alcançado um acordo e alerta para as desvantagens daí
resultantes. A falta de consenso pode levar à arbitrariedade na interpretação
das leis existentes e ao ajustamento daquelas conforme os interesses e conve-
niências dos beligerantes114. Tal conduziria a um deplorável efeito na opinião
pública do mundo civilizado115.
Martens termina a sua intervenção sem apontar soluções concretas, a ses-
são foi adiada e retomada em 20/06/1899, pela segunda subcomissão.
Sobre a metodologia usada na condução dos trabalhos, nesta sessão
Lapradelle destacou a habilidade com que foi conduzida para alcançar um
resultado que considerou muito aquém do desejado. Iniciou-se pelas ques-
tões mais fáceis (já consolidadas pela prática) e foram descartadas as mais
116.
Foi uma tática ardilosa por ninguém querer comprometer o êxito dos tra-
balhos, após tantos consensos obtidos, mesmo tratando-se de questões fáceis.
Todavia, foi como Lapradelle referiu, as questões verdadeiramente contro-
vertidas continuaram em aberto e o trabalho dos delegados, desprovidos de
117.
À luz daquela estratégia, os artigos 9 e 10, por serem os mais controverti-
    
preencher para a determinabilidade do beligerante e, para tanto, apresentava
uma dicotomia entre combatente e não combatente, previam, ainda, o levée
en masse118.
Martens despendeu toda uma ordem de raciocínio, que viria justamente
culminar na antítese da sua pretensão referida na sessão antecedente. As vir-
tudes, antes defendidas com relação à regulamentação da guerra, perderiam
a sua atração para, agora, darem lugar a uma remissão para a lei das nações,
ou seja, retomar-se-ia, embora em moldes distintos, a proposta belga. Veja-
mos, então, como ocorreu este volte face.
Em suma, Martens relembrou não ter sido intenção da Conferência de
Bruxelas abolir o direito à resistência. Com efeito, a Conferência tinha perce-
114 Ibidem, cit., p. 507.
115 Ibidem, cit., p., 507.
116 LAPRADELLE, A. G., «La Conférence de la Paix», cit., pp. 726-727.
117 Idem, cit. p. 727.
118 SCOTT, J.B., The Proceedings of the Hague Peace Conferences, The Conference
of 1899, cit., p. 547.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
384
bido que o seu dever não era tentar formular um código para casos que não
 como os do levée en masse, mas antes garantir
mais direitos à população119.
Todavia, relembramos que o levée en masse foi restringido pelas grandes
potências através da exigibilidade de requisitos espaciais (apenas podia ocor-
rer em territórios não ocupados) e temporais (no momento da invasão) que
são, por sua vez, os critérios constantes no artigo 10.
Acrescenta Martens 
os casos que pudessem eventualmente ocorrer120. Findo o seu discurso, requereu
 
nas minutas da Conferência e que, pela sua importância, se transcreve121:
“A Conferência é unânime em pensar que é extremamente desejável que os usos da
     
      
  -
sidades o permitam. Todavia, não foi possível acordar imediatamente sobre disposições
que abranjam todos os casos que ocorram na prática.
Por outro lado, não podia ser intenção da Conferência que os casos não previstos
devessem, por falta de uma disposição por escrito, ser deixados ao julgamento arbitrário
dos comandantes militares.
  
a Conferência julga acertado declarar que, nos casos não previstos no presente acordo,
    -
   
das leis da humanidade e das exigências da consciência pública” (tradução da nossa
autoria).
Assistiu-se, assim, ao nascimento da cláusula Martens, vertida no último
parágrafo da declaração, e que não foi isenta de contenda.
A discussão esteve sempre presente naquela sessão e o texto não foi adota-
do facilmente. A Grã-Bretanha tomaria partido das pequenas potências para,
assim, contrapor argumentos ao poder militar Russo, Alemão e, por inerên-
cia, às grandes potências123.
119 Ibidem, cit., p. 547.
120 Ibidem, cit., p. 547.
121 Ibidem, cit., pp. 547-548.
122 Ibidem cit., pp. 547-548.
123 Ibidem cit., pp. 552.
ESTUDOS LUSO-HISPANOS DE HISTÓRIA DO DIREITO
385
     

da conferência124.
Os registos existentes não permitem aferir, com clareza, como é que a
cláusula Martens foi inserida no preâmbulo da II Convenção da Haia. Na
quarta sessão da segunda comissão de 05/07/1899, foi aprovado um preâm-
bulo que foi beber consideravelmente à declaração expressa por Martens125.
Naquele mesmo dia, foi aprovado, na quinta sessão plenária, o preâmbulo
cláusula Martens126:
“Até que possa ser estabelecido um código completo sobre a leis da guerra, as
Altas partes Contratantes julgam acertado declarar que, nos casos não previstos
nos regulamentos por elas adotadas, as populações e beligerantes permanecem
sob a proteção e império dos princípios do direito internacional, tais como re-
sultam dos usos estabelecidos entre nações civilizadas, das leis da humanidade
e das exigências da consciência pública” (tradução da nossa autoria)127.
IV. CONCLUSÕES
A cláusula Martens nota, assim, uma estranha alquimia. O seu poder al-
químico demonstra a presença dos diferentes interesses representados pelos
seus atores e de difícil conciliação.
Na sua génese, esteve o diálogo que então opunha, principalmente, as
grandes e pequenas potências sob as vestes, por um lado, da guerra, respetivo
poderio militar e, por outro lado, uma então, ainda, embrionária humanida-
de. Para além daquelas potências, outros atores nela viriam impactuar. Entre

o poder da imprensa.
Quando proposta por Martens, nos moldes em que o fez, este, decerto,
teve em mente toda esta complexa galáxia de intervenientes, com os seus po-
deres. Ao que acresceu, ainda, a premente necessidade sentida pelos então
Intervenientes na I Conferência da Paz e pelo próprio Martens, desta não ser
havida como um fracasso absoluto.
124 Ibidem cit., p. 552.
125 Ibidem, cit., p. 413.
126 Ibidem, cit., p. 43.
127 SCHINDLER, D., TOMAN J.-
ventions, Resolutions and Other Documents, cit., p. 55.
ANABELA PAULA BRÍZIDO
386
O impasse entre pequenas e grandes potências fruto, por sua vez, da deli-
cada conjuntura vivida, explica, em certa medida, o facto de ela corresponder
à antítese do por si pretendido, ou seja, a regulamentação da lei da guerra
por preceitos concretos. A sua remissão para “os princípios do direito inter-
nacional tais como resultam dos usos estabelecidos entre nações civilizadas,

obtenção de um consenso mais pormenorizado.
Ironicamente, a cláusula acaba por acolher parte do texto da proposta bel-
ga a que Martens, inicialmente, se opôs. Com isto, ela retoma o ponto de
partida cujo cenário pretendeu afastar, repete-se a não regulamentação, por
preceitos concretos, da lei da guerra.
Este estudo pretende, assim, demonstrar a cláusula, expressar o consenso
então possível perante os diferentes interesses, atores e poderes em presença.
A constante tensão entre estas variáveis foi impeditiva de um diálogo mais

Elas expressam, ainda, os diferentes contextos culturais, sociais, económi-
cos e jurídicos dos atores em presença. Estas, por sua vez, ditaram conceções
distintas perante uma mesma realidade, a guerra, o que impactuou na pró-
pria determinabilidade do conteúdo de conceitos jurídicos relevantes, como
ocupação, ocupação beligerante, necessidade militar e humanidade.
Não podemos, por isso, deixar de reconhecer, com Giladi, alguma ironia,
mas isso não deve fazer perder de vista a atualidade, o mérito e a importância
da cláusula para o direito. A sua natureza controvertida permanece, mas à luz
de contextos, atores, poderes, diálogos distintos, por comparação com os do
século XIX.
Cumpre, por isso, questionar, em jeito de conclusão, se não é justamen-
te a omissão de uma regulamentação concreta com relação a determinadas
matérias que permite, em parte, alicerçar, hoje, toda a dinâmica em torno da
cláusula.
Usada como um importante referencial interpretativo, nos casos de ausên-
cia ou parca regulamentação, acaba sempre por partir da antítese do pensa-
mento que esteve na sua origem - a necessidade de uma regulamentação mais
pormenorizada - reiniciando, dessa forma, novos e sucessivos processos de
diálogo como se da outra face de Janus se tratasse128.
128 TEUBNER, G., «Die zwei Gesichter des Janus: Rechtspluralismus in der Spätmo-
derne», em Liber Amicorum Josef Esser, Müller, (Heidelberg), 1995, pp. 191-192.
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